“Tá rindo de quê?”
Na “mais grave crise de toda nossa História” não tem espaço, segundo o ex-governador, ex-prefeito de capital e ex-ministro Ciro Gomes, para rir. É este, segundo ele, o motivo pelo qual ele é sempre chamado de pavio curto. Em discurso para uma plateia de militantes do PDT, o partido ao qual é
filiado depois da passagem por seis partidos, o mais expressivo dos
irmãos Gomes questionou o presidente do partido Carlos Lupi sobre o
motivo de sair sorrindo nas fotos. “É pedido da mãe, ele já explicou que é por isso que tem que sair
sorrindo nas fotos. Não tem como rir com os números que temos hoje”,
disparou.
Já tirando do papel a proposta de
concorrer à eleição presidencial de 2018, Ciro, com ajuda de um ato
falho, expôs aos militantes a estratégia para conquistar o lugar hoje
ocupado pelo presidente Michel Temer.
Em seguida, ele emendou: “Nada contra o
Lula, apenas acho que está na hora de encerrar essa briga PT e PSDB e
colocar um projeto novo.”
O tal projeto é a única saída possível,
na visão do candidato derrotado à presidência em 2002 pelo PPS e ainda
associado à ex-namorada atriz Patrícia Pillar, para a mais grave crise,
como ele define o momento atual.
No fim do discurso aos militantes, em
Guarulhos (SP), Ciro concedeu uma entrevista exclusiva ao HuffPost
Brasil na qual admitiu abrir mão da possibilidade de se candidatar caso o
ex-presidente Lula decida concorrer ao cargo, embora não concorde com a
candidatura do petista.
Ciro, inclusive, não concorda com muita
coisa. Não está de acordo com as reformas, promete revogar a PEC do teto
de gastos, discorda da estratégia para anistiar o caixa dois. Nem o
discurso do não-político do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), Ciro aceita: “Mil vezes, na minha opinião, um Bolsonaro do que um enganador desse tipo”.
HuffPost Brasil: Tem espaço para uma candidatura sua e do ex-presidente Lula?
Ciro Gomes: Acho que
não há espaço para duas candidaturas em um momento como este. Se
tomarmos por exemplo como sintoma da nossa força potencial, salvo o
carisma do Lula, a organicidade hoje está reduzida à seguinte proporção:
do centro à esquerda, já supondo que o partido da Marina seja um
partido de esquerda, o que eu já tenho grande dúvidas sobre isso, nós
[esquerda] temos hoje 100 deputados, em 500. Nós temos 100 contra 400.
Nesses partidos todos, são cinco partidos, quatro candidatos. Isso na
minha opinião, é irresponsabilidade com o País. É evidente que nesse
momento todo mundo tem direito. E quem sou eu, muito menor que o Lula.
Mas eu acho que aquilo que eu falei, o mais do mesmo, ou essa
radicalização PSDB e PT já exauriram o ciclo. É preciso dar passagem,
não digo para uma candidatura como a minha, mas é preciso dar passagem
para um novo projeto.
Um projeto que tenha coragem de
confrontar essas premissas estúpidas que estão destruindo a economia
brasileira e o maior sintoma disso são 20 milhões de pessoas, 13 milhões
de desempregados e sete milhões em condições precárias.
Temer está agravando os problemas.
Existe um conflito distributivo no País e quem está mandando com o Temer
é o baronato, o baronato financeiro. O mundo produtivo brasileiro e o
mundo do trabalho estão passando o pão que o diabo amassou sem
precedentes, por isso que há uma fresta aí para a gente conseguir
repactuar o Brasil. Quem produz na roça, quem produz na fábrica, quem
está no comércio sabe que as coisas estão profunda e definitivamente
erradas no País e o trabalhador, então, nem se fala. Para além do que
está acontecendo com um desempregado de família no Brasil, existem hoje
ameaças graves sobre a precarização no mercado de trabalho, sobre os
aposentados e pensionistas. Se passa na cabeça de alguém que seja
razoável um país como o nosso tão desigual estabelecer idade mínima de
65 anos independentemente do trabalhador engravatado, que dá expediente
no ar condicionado, e aquele outro que é operário da construção civil e
está trabalhando de sol a sol no semiárido do Nordeste ou nas carvoarias
do Pará… Isso não tem cabimento, é uma desumanidade completa.
O teto de gastos
é uma perversão que vai se revelar insustentável. Portanto, tenha
clareza que se depender de mim, isso será revogado. O que não quer dizer
que o valor que está ali não seja um valor que tenha que presidir as
relações de um governante com as finanças públicas. Sou ex-governador,
ex-prefeito de uma capital, ex-ministro da Fazenda, não tenho um dia de
déficit. Tem que tem saúde fiscal. Para o País enfrentar os seus
problemas, é preciso ter sanidade fiscal, mas nunca preservando 50% do
orçamento livre para a despesa mais perversa que são R$ 700 bilhões para
juros este ano. Isso cortando em educação e saúde de um país que já tem
condições tortas e desumanas na oferta de saúde, especialmente para o
povo.
A única fórmula, por exemplo, de eu
entrar em uma dinâmica da reunificação é estabelecer um método e o
método há de ser um programa. Eu não aceito mais esse pragmatismo que se
relevou uma tragédia que o PT impôs, com todo o respeito ao PT. O PT
não é meu inimigo, não é meu adversário, pelo contrário. Em 1989, votei
no Covas no primeiro turno e no Lula no segundo e venho votando. O Lula
queria porque queria que o (Henrique) Meirelles fosse ministro da Dilma.
Tivemos um golpe de Estado e o adversário golpista nomeia o Meirelles
ministro da Fazenda. Tem uma coisa errada e eu sei que está errada.
Chega de conciliação e isso não quer dizer ruptura nem briga, quer dizer
experimentar outro caminho, outro modelo, outra premissa. Estou
estudando e isso me deixa muito enraivecido e isso me faz parecer pavio
curto, mas nós estamos aí massacrando a nação de 200 milhões de pessoas.
Com política e democracia. Quando o PT
lançou o Lula em 1989, o PT tinha 12 deputados. Quando o PSDB lançou o
Fernando Henrique em 1994, o PSDB tinha 17 deputados. O problema não é
esse [governo de coalizão], é a ideia. Como unir uma grande maioria do
povo brasileiro e a democracia garante isso ciclicamente.
Esse modelo é uma mentira do Fernando
Henrique que o Lula replicou. A Dilma caiu por isso; porque resolveu
conciliar com bandido, com Eduardo Cunha. Meu irmão [Cid Gomes] era
ministro da Educação, chamou o Eduardo de ladrão e ela ficou com ele.
Olha onde eu estou e meu irmão. Antes era teórico, agora é
experimental. Repare bem, Fernando Henrique perdeu para o Lula e a Dilma
caiu por causa desse projeto. Isso está correto? Esse é o caminho certo
para o fracasso.
No seu discurso, o senhor
ressaltou que o eleitor não se vê representado. Na sua avaliação, este é
o fomentador da onda conservadora que faz que o deputado Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) e o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), despontem nas
pesquisas?
Sou um democrata de verdade, sou um
democrata visceral e o que as pessoas veem como uma coisa ruim, eu vejo
como uma coisa boa. Se há uma parcela do eleitorado que se afina com o
que o Bolsonaro interpreta, representa e diz, essa fração tem todo
direito que um democrata deve garantir sem qualquer tipo de queixa de se
expressar na política. Evidente que no debate, eu estando presente, vou
arrancar muitas máscaras. Esse João Doria se apresentar como não
político, ele está esquecido que foi presidente da Embratur no governo
do Fernando Collor, ele está esquecido – e eu tenho uma memória
implacável – de que a empresa dele vivia de milhões de reais de dinheiro
público repassado por correligionários deles, de governo do PSDB. Isso
que é não-político? Mil vezes, na minha opinião, um Bolsonaro do que um
enganador desse tipo.
Evidente que não. Isso é um escárnio com
a população brasileira. Tecnicamente, você pode até estabelecer uma
distinção. Mas não estamos em um momento técnico, muito menos de
tecnicalidade polêmica. Neste momento, o que a sociedade brasileira
quer, espera e exige é que a punição deixe de ser só para ladrão de
galinha e pequenos, pobres, negros, periféricos do Brasil, para alcançar
os corruptos e caixa dois definitivamente é um sintoma de corrupção.
Sem dúvida, com dois caminhos: organizar
a relação de dinheiro e política e introduzir o recall, instrumento em
uma democracia direta com referendo em que você possa desconstituir um
mandato, não porque corrompeu, mas porque mentiu ou está fazendo o
oposto do que prometeu.
FONTE: huffpostbrasil.com
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