REDES DE ÓDIO
Política e jornalista, Manuela d'ÁvilaManuela d’Ávila , filiada do PCdoB, concorreu as últimas eleições municipais para a prefeitura de Porto Alegre em 2020 , e tem em sua mantido em sua carreira como militante o apoio às pautas de diversidade, pelo espaço das mulheres no âmbito político e pelo fim do discurso misógino, que segundo ela, se agravam a cada tentativa de inserção de mulheres no poder público.
Para a ex-deputada federal, a maternidade também é política e a presença da filha Laura, hoje com cinco anos, durante as campanhas eleitorais, foi mais positivo do que negativo, mesmo que a presença da criança nas agendas políticas tenha gerado críticas.
Nessa entrevista, a política e jornalista falou sobre a representatividade no espaço político e desenvolvimento de políticas públicas, sobre o discurso misógino e sobre a maternidade.
Para começar, você pode apontar o momento mais difícil que já passou em sua carreia política?
É difícil escolher um só, porque não necessariamente, o que foi o pior tenha sido o mais difícil, porque lamentavelmente a gente aprende a lidar com as dificuldades.
Talvez o mais difícil, tenha sido a primeira vez que eu fui ameaçada, em 2005, eu mal tinha assumido meu mandato como vereadora, tinha 23 anos e começaram a ameaçar a mim, a partir da minha mãe.
E depois quando eu comecei a ser agredida fisicamente na rua por fake news. Ai sim, foi algo muito forte, com muitos fatos que aconteciam juntos com a minha filha muito pequena, comigo grávida. Então, não é uma escala de gravidade, mas sim o que foi mais surpreendente.
Com o avanço do extremismo no Brasil, a "liberdade de expressão”, o conservadorismo em cima de políticas voltadas para certos grupos da nossa sociedade cresceram significativamente. E com as redes sociais, o espaço para o xingamento, críticas e cobranças também aumentaram. Qual cenário a gente pode esperar ano que vem, em sua opinião?
Olha, eu já fiz análises equivocadas sobre isso baseadas um pouco no meu otimismo. E eu aprendi que incrivelmente só piora, porque quando eu aceitei disputar a eleição em 2020, as pessoas que gostam de mim me perguntavam se eu estava preparada para sofrer novamente a violência que eu tinha sofrido em 2018.
Eu dizia ser impossível sofrer mais violência porque, afinal de contas, eu tinha ido para o segundo turno contra Bolsonaro, digamos assim, o criador, junto com alguns grupos, de toda tecnologia da violência política e do ódio contra as mulheres no nosso país. E eu pensava que, por ser alvo deles desde 2014, poderia significar algo, mas eu estava enganada porque, na verdade, a violência política e as redes de ódio são cumulativas.
Eles não começam do zero contra mim. A cada eleição eles começam de onde eles pararam. Então eles utilizam uma espécie de recall de tudo o que eles fizeram e com isso, eles trabalham com que fica no inconsciente coletivo e dessa maneira eles constroem as novas redes de violência.
A partir disso, eu digo acho que será cada vez pior. Apesar das pessoas dizerem que sabem sobre as fake news, em 2018, quando eu dizia que era vítima disso, as pessoas achavam que era neurose, que era imaturidade. Elas não sabiam qual era escala daquilo.
O Judiciário não recolhia as nossas ações, porque afinal de contas, isso é critica e pessoas públicas têm que saber lidar com críticas. Agora as pessoas e o Judiciário sabem que existe, porém, ao mesmo tempo que isso nos acolhe, a prática é crescente.
Você como mãe, já participou de algumas campanhas políticas em que seus oponentes usavam a sua maternidade como insulto. Inclusive, uma foto sua amamentando durante uma sessão no Plenário, em 2016, é muito repercutida até hoje. Quais barreiras precisam ser rompidas para que as mães sejam respeitadas e representadas no ambiente político?
Ter tornado a minha maternidade visível talvez tenha sido a ação mais importante que eu fiz na minha vida política. No ambiente público, não só o político, existe uma negação a existência de crianças. Eles renegam as crianças, pois não reconhecem a existência das mães. Eu quero amamentar a minha filha, então significa uma alteração na minha rotina.
Por exemplo, quando eu fui candidata a presidente (do partido PCdoB), eu tinha que mostrar para as pessoas que eu tenho uma filha amamentada e que ela viaja eventualmente comigo. As pessoas sempre falam dos momentos em que ela estava comigo, mas antes, eu decidi não concorrer a prefeita em 2016, porque ela tinha seis meses, a demanda de uma criança de seis meses é completamente diferente de uma de quase três, quando eu tava concorrendo. Eram relações e demandas maternas diferentes.
Então, para mim, essa é a caminhada que eu mais gosto de ter construído porque foi uma caminhada que me colocou a prova, colocou o meu machismo a prova, as relações de poder que eu exerço a partir dos lugares que eu ocupo a prova.
Esse não era o meu lugar de fala, então mesmo sendo uma militante ao longo de toda a minha vida em defesa das mulheres, eu não tinha ideia no que a maternidade exercia na realidade como instrumento de construção da opressão, por mais que eu entendesse teoricamente o que acontecia.
(Por
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