MEIA PASSAGEM
Igor Jácome
Repórter
O Procon estadual vai começar a notificar ainda nesta terça-feira (28) as empresas concessionárias do transporte público da capital potiguar flagradas em desobediência à decisão liminar expedida pela juíza Francimar de Araújo Dias, da 2ª vara da Fazenda Pública de Natal no último dia 17. O mandado obrigava as empresas a receberem o pagamento da meia-passagem de estudante também em dinheiro, além do sistema NatalCard.
Após a notificação, as empresas terão um prazo de dez dias para apresentar defesa e poderão ser multadas após a realização de processo administrativo do órgão de proteção do consumidor. A medida será baseada nas fiscalizações realizadas desde o último sábado (25) nas principais paradas de ônibus da capital potiguar. “Foram 20 ônibus vistoriados, de todas as empresas da cidade. Constatamos que nenhuma delas está cumprindo a determinação da juíza, quando ainda não há ainda nenhuma decisão contrária”, lembrou o sub-coordenador de fiscalização, Frederico Mendonça.
Durante as fiscalizações, todos os motoristas e cobradores questionados afirmaram que não tinham autorização para receber o pagamento da metade da tarifa de ônibus, a que tem direito os estudante, em dinheiro. Houve flagrantes, em que estudantes tentaram pagar, na presença dos fiscais, e não obtiveram sucesso. Em uma das situações, um ônibus da linha 33 foi retido durante cerca de 20 minutos na parada do Via Direta, no sábado. Ontem (27) foram mais dois ônibus retidos.
“Como era horário de pico, nós não impedimos que os ônibus continuassem a viagem, mas os estudantes passaram nas catracas e pagaram apenas a meia passagem. Os cobradores afirmaram que eles é que ficariam no prejuízo”, afirmou o fiscal Aracildo Júnior.
De acordo com o Procon, as fiscalizações devem continuar, mas é importante que a população faça denúncias. O telefone de contato é o 151. O consumidor também pode procurar um dos postos de atendimento localizados no shopping Via Direta, na zona Sul, e no Shopping Estação, na zona Norte da cidade.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Natal (Seturn), informou que não se pronunciaria sobre o assunto.
Debate jurídico
O procurador geral do município, Carlos Castim atendeu à reportagem nesta terça enquanto entrava na sede da 2ª vara de Natal para se reunir com a juiz Francimar Dias. De acordo com ele, até o momento o município de Natal não foi notificado da decisão. O Seturn confirmou sua notificação ainda na última semana, porém, segundo o entendimento do procurador, as empresas é quem deveriam ter sido notificadas.
Castim argumentou que essa medida seria necessária para que as empresas estivessem cumprindo a liminar. Além disso, a decisão seria contrária a entendimentos prévios. “Essa decisão fere a legislação municipal, a lei da bilhetagem eletrônica e todos os mecanismos de controle e negociação de passagem de estudante pelo município. Hoje a carteira garante que o estudante faça o deslocamento integral dentro da cidade, em 60 minutos, apenas com uma passagem. Além disso, a carteira é gratuita”, colocou.
O processo, de acordo com ele, seria mais um resultado de briga entre entidades estudantis. “A Une e Ubes têm convênio com o município para dar as carteiras de forma gratuita, e a Urne [a União Norte-riograndense de Estudantes foi a autora da ação], pois ela não oferece o detalhamento necessário sobre os estudantes cadastrados. Por exemplo: a pessoa se matricula no curso de inglês, passa um mês e sai, mas a carteira fica valendo um ano. Isso causaria o encarecimento para o sistema e para o próprio estudante que tem que pagar a carteira”, disse.
O assessor jurídico da Urne, Thales Goes afirma que essa é uma tentativa “desesperada” do município de mudar o foco da dicussão. “É falta de argumento. Existe, de fato, um convênio fraudulento entre a Prefeitura e essas entidades, desde a gestão de Micarla de Sousa. Esse convênio já foi requerido, mas nunca apareceu, ninguém sabe onde está. Ele nem existe. Essas entidades sequer têm habilitação para fazer carteira de estudante. O próprio Ministério Público entrou com uma ação em 2011, que está na 5ª Vara, mas até hoje não foi julgada”, afirmou. “A decisão não tem nada de política. Diz respeito apenas ao direito dos estudantes”, defendeu.
Sobre os argumentos jurídicos do procurador, o assessor da Urne considerou que se trata de uma situação normal no Direito, em que uma lei municipal é contrária a uma norma de abrangência nacional, portanto não teria validade. “Essa lei municipal contraria o Código de Defesa do Consumidor. Ela fere a isonomia, ou seja: o estudante não pode ter o tratamento diferenciado dos outros passageiros, e está acontecendo. Além disso, toda empresa é obrigada a receber pagamento na moeda corrente nacional”, argumentou. Thales Goes ainda destacou que, apesar do município ser o responsável pela regulamentação do transporte público, sua responsabilidade é limitada ao relacionamento entre o Executivo e o concessionário. As relações entre empresa e cliente estariam todas vinculadas ao Código de Defesa do Consumidor.
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