quarta-feira, 29 de abril de 2015

Trabalhadores do Judiciário em greve doam alimentos à Casa do Estudante‏. Doação à Casa do Estudante foi de cerca de 800 quilos de alimentos não perecíveis

SOLIDARIEDADE

Fotos: Estúdio Valmir Queiroz
Fotos: Estúdio Valmir Queiroz
Os trabalhadores do Judiciário Potiguar – em greve desde 17/03 – fizeram nesta terça-feira, 28/04, uma doação à Casa do Estudante de cerca de 800k de alimentos não perecíveis, arrecadados em atividades do movimento paredista nos dias 23, 24 e 27/04.

Cerca de 200 grevistas caminharam da Praça Sete de Setembro até o histórico prédio onde funciona a residência estudantil, quando fizeram a entrega. A instituição passa por dificuldades.

“Nossa greve, além da doação de alimentos, denuncia o estado de abandono em que se encontra esta casa tão importante para o desenvolvimento do RN”, disse Bernardo Fonseca, dirigente do Sindicato da Justiça (Sisjern).

“Inadmissível que a casa na qual vivem estudantes pobres do interior esteja neste estado e que, ao mesmo tempo, juízes recebam auxílio-moradia”, disse o estudante do IFRN Washington Luis, 19 anos, da cidade de Portalegre, morador da Casa há dois anos e responsável por receber os alimentos.

Parte dos donativos, os moradores enviaram à Casa da Estudante – onde vivem apenas mulheres – situada à Rua Junqueira Aires, na Cidade Alta. Há casas do estudante também em Mossoró e em Caicó.

SOBRE A CASA DO ESTUDANTE
Na Casa do Estudante vivem mais de 80 pessoas, que pagam uma mensalidade de R$ 25,00, dinheiro administrado pela própria entidade. Fundada há 69 anos, a instituição, “além de funcionar em edificação tombada, ela própria também o é”, explica o ex-morador e advogado Edmilson Leão Jr, 28 anos, da cidade de Patu e que tenta ajudar juridicamente a instituição.

Leão diz que, uma vez a Casa do Estudante não tendo condição de se manter, cabe o Governo do Estado fazê-lo, em função do tombamento, o que historicamente sempre ocorreu – através da Secretaria de Trabalho, Habitação e Ação Social (Sethas) – as vezes de forma muito precária, como agora – em que falta até comida – as vezes não.

Além da falta de repasse – há quatro meses – de comida, o belíssimo prédio – que tem 50 quartos, além de outros compartimentos – é cheio de infiltrações, fiações expostas, equipamentos danificados, não há segurança e parte da edificação se encontra interditada pela Defesa Civil.

O atual presidente da Casa, o estudante de Engenharia Civil Jorge Danilo da Silva, 25 anos, de Alexandria, cinco anos de Casa, diz que a instituição conta com um funcionário na cozinha e outro na limpeza – ambos mantidos com o dinheiro arrecadado entre os estudantes-moradores. “Antes o Governo do Estado mantinha dois homens da Guarda Patrimonial aqui, mas isso acabou”, denuncia Danilo, que terá reunião com membros do Ministério Público para discutir a questão.

“”Quando cheguei aqui, o presidente da Casa me recebeu, levou-me ao quarto e disse, apontando para uns jornais, “aqui será sua cama, por que não temos outra”””, disse o Oficial de Justiça grevista Dauri Macedo, 52 anos, natural de São Gonçalo do Amarante, que viveu na casa de 1980 a 1986. “Porém com pouco tempo, houve uma reforma e as coisas melhoraram muito, ganhamos camas, armários”, continua o OJ, concluindo que “as crises na Casa do Estudante são cíclicas e nunca deixam de ocorrer”, diz.

Situação parecida conta o Auxiliar Técnico também grevista Diogo Maia, 34 anos, de Almino Afonso, que viveu na Casa de 1996 a 1998, período logo posterior à uma reforma. “Havia assistência médica e odontológica e a comida às vezes faltava, mas agora falta todo dia”, diz.

Edmilson Leão Jr, que viveu na casa por dois períodos – 2002 a 2004 e 2006 a 2009 – diz que a última reforma, em 2006, “foi apenas uma maquiagem”, tendo logo tudo começado a ruir, informação corroborada por outros presentes à conversa, sempre com exemplos. Aliás, sua volta para o interior se deu justamente em função disso: “colocaram os estudantes em uma casa em condições piores, no período da maquiagem e achei melhor, por este período, voltar para minha cidade, para depois retornar, com o fiz”, conta.

Da Casa do Estudante saíram figuras importantes da história do RN, como o ex-presidente da Casa no período 1967/1968, o poeta Emanoel Bezerra dos Santos, assassinado pela Ditadura Militar.

Trata-se de um espaço crucial para que famílias de baixa renda do interior tenham alguma chance de fazer com que seus filhos concluam os estudos. Tem importância equivalente a outras políticas públicas na área da educação, como vagas públicas e/ou financiamento, e deve existir de forma articulada com elas, pois em geral, quem precisa de uma precisa das outras, ou seja, falhando uma delas, carreiras e sonhos serão interrompidas.

Edmilson Leão Jr, por exemplo, cursou sua graduação em Direito no Centro Universitário do RN (UniRN), através do Programa Universidade para Todos (Prouni), do Governo Federal, que mantém vagas em instituições privadas, a partir dos resultados do Enem. Já Jorge Danilo usa o Fies, também do Governo Federal, para financiar seu curso de Engenharia Civil na Universidade Potiguar (UnP).

Ao sair da Casa do Estudante, o OJ Dauri Macêdo foi morar na Residência Universitária da UFRN, na condição de estudante de letras, graduação que concluiu. Já Diogo Maia, que cursou Direito na UERN, foi para a da Ufersa.

GREVE CONTINUA, APESAR DE DECISÃO LIMINAR POR ILEGALIDADE 
A categoria, em assembleia no dia 22/04, decidiu por unanimidade continuar em greve, apesar da Decisão liminar do Des. Glauber Rego, publicada em 17/04, pela ilegalidade do movimento, proibindo, porém, o corte de ponto dos dias parados até então, que não precisarão ser compensados.

Assessoria Jurídica do Sisjern entrou – segunda-feira, 20/04 – com dois recursos contra a decisão liminar – uma Reclamação Constitucional junto ao STF e um Agravo de Instrumento junto ao TJRN. Ambos com efeito suspensivo – até que sejam julgados os recursos – em relação a corte de ponto e a desconto de salário que venha a ocorrer.

A multa ao Sindicato pelo não encerramento da greve conforme a Decisão liminar é de R$ 10 mil ao dia. “Só pode haver execução da cobrança pelo Estado ao final do processo, ou seja, depois dos julgamentos dos recursos, segundo entendimento pacificado no STJ”, afirma Hélio Miguel, advogado do Sindicato.
A categoria reivindica a fixação de uma data-base; a não implementação das medidas contra os servidores anunciadas pelo Presidente do TJRN, Des. Cláudio Santos; e, conforme lei, a progressão funcional.

Entre as medidas de Santos, está a Portaria que dispensou os Diretores de Secretaria, já tornada sem efeito por ato do Juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública do TJRN, Luiz Alberto Dantas Filho, que atendeu pleito liminar solicitado por Ação Civil Pública do Sindicato da Justiça (Sisjern). Agravo de Instrumento da PGE sobre a questão foi negado pelo Des. Vivaldo Pinheiro, que manteve o entendimento de Dantas Filho.

AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO NÃO CHEGOU A UM ACORDO
A Audiência de Conciliação entre os servidores do Judiciário Potiguar e a Presidência do TJRN – ocorrida em 16/04 – não chegou a um acordo. A proposta do Tribunal – de implantar data-base desvinculada de índice de inflação e que os grevistas fizessem reposição dos dias parados em 90 dias, sem utilização de banco de horas já acumulado – não foi aceita pela categoria.

A negociação foi mediada pelo Des. Glauber Rego, Relator do pedido de ilegalidade da greve – feito pelo TJRN, através da PGE/RN – do qual a audiência, por sugestão do Sindicato da Justiça (Sisjern), era consequência.

O Sisjern foi representado na Audiência pelo seu Diretor-coordenador, Bernardo Fonseca, acompanhado dos advogados Felipe Monnerat e Hélio Miguel. O Secretário Geral do TJRN, Fernando Jales, e a Assessora da Presidência do Tribunal, Juíza Tatiana Delgado, representaram o Presidente da Corte, Des. Cláudio Santos. O Procurador Geral do Estado-adjunto João Carlos Coque representou a PGE/RN; Jovino Pereira, Procurador Geral de Justiça-adjunto, o MPRN; e Adilson Gurgel, a OAB/RN.

Após ouvir a proposta, Bernardo Fonseca a levou à categoria, que se encontrava em assembleia no Centro Pastoral D. Heitor de Araujo Sales, próximo à sede do Tribunal, onde ocorria a audiência.

Por contraste visual – com pouquíssimos votos contra – a assembleia, com cerca de 700 presentes, entendeu que a proposta, para ser aceita, teria que ser vinculada a um índice de inflação.

De volta à audiência, Bernardo Fonseca ouviu dos representantes de Cláudio Santos que não incluiriam nenhum índice de inflação na proposição bem como não aceitavam a realização de uma segunda audiência, dando-se por encerrada a negociação.

Horas depois, Glauber Rego decidiu liminarmente – com publicação no dia seguinte – pela ilegalidade da greve, proibindo, porém, o corte de ponto dos dias parados até então, que não precisarão ser compensados, ou seja, só haverá desconto de vencimento relativo a dias seguintes à publicação da Decisão. A multa ao Sindicato, conforme a Decisão, será de R$ 10 mil ao dia, pelo não encerramento da greve
Diz o Relator em sua Decisão que a greve começou dentro da legalidade, pois “antes do início do movimento paredista, em 17/03/2015, houve várias tentativas por parte do Sisjern de se abrir um canal de negociação, o que restou frustrado (…) e há informações no caderno processual de que os servidores preservaram 30% de seu efetivo, exigido por lei”.

No entanto, ao final do documento, Rego afirma que “Em que pese a relevância de assegurar o direito de greve, não se pode admitir a sua perpetuação irrestrita, comprometendo a continuidade de um serviço de natureza essencial e de elevada envergadura para o interesse público”.

E decide que ” … o corte do ponto com os descontos dos salários ou a respectiva compensação relativos aos dias de paralisação apenas poderão ser empreendidos a partir desta decisão, e caso os servidores não retornem à normalidade dos trabalhos, eis que ainda não havia sido declarada a ilegalidade do movimento paredista, não podendo eles serem punidos pelo período em que exerciam o direito de greve dentro da legalidade”.

“A proposta do Presidente Cláudio Santos era tão ruim que conseguiu ser pior que a decretação da ilegalidade da greve, já que nesta última, não nos foi cortado o ponto e nem somos obrigados a compensar os dias parados”, disse um sindicalizado presente à assembleia.

43 DIAS DE GREVE
Cerca de 400 grevistas fizeram, em 22/04, o Enterro da Justiça – simbólico cortejo fúnebre pelas ruas da cidade carregando um caixão. Partiram do Centro Pastoral Dom Heitor de Araujo Sales, onde ocorrera assembleia da categoria, e passaram pela Catedral Metropolitana de Natal e pelas sedes da OAB/RN e do TJRN, onde “depositaram” a urna.

O Enterro foi uma entre várias atividades da greve. Nestes 43 dias de paralisação, os servidores não ficaram parados: carreatas, atos públicos, assembleias, campanhas de doações de sangue, apitaços e buzinaços, entre outras coisas, marcaram as ações dos trabalhadores do Judiciário Potiguar, provocando reações variadas de magistrados.

Uma dessas reações ocorreu no dia 26/03, uma quinta-feira, quando a juíza da Vara de Violência Doméstica, Maria do Socorro Pinto, proibiu, com força policial, a entrada dos grevistas ao Edifício Milenium, prédio que funciona como anexo do Fórum Miguel Seabra Fagundes e onde, nas proximidades, se realizava mais um Ato Público do movimento. Servidores lotados no Edifício acenavam das janelas, solicitando a presença dos manifestantes.

Após negociações, a magistrada permitiu a entrada de apenas quatro grevistas. O caso se encontra sob análise da Assessoria Jurídica do Sindicato da Justiça (Sisjern).

Não se trata de uma situação inédita, embora, desde o início da greve os manifestantes viessem tendo acesso a todos os prédios, inclusive ao Fórum Seabra Fagundes, onde os grevistas já haviam entrado dias antes e onde retornaram, momentos depois de saírem do Anexo.

Em 11/03, uma equipe de foto/filmagem do Sindicato da Justiça (Sisjern) foi impedida de ter acesso à Sessão do Pleno do TJRN, sendo escoltada militarmente até à Secretaria de Comunicação do TJRN, quando, depois de um tempo, foi comunicada da proibição de acessar o plenário. Vários servidores também tiveram negado o acesso à galeria. Na Sessão do dia 18/03, o TJRN voltou a dificultar, sem sucesso, o acesso ao plenário da categoria e da equipe de foto/filmagem.

A Sessão do Pleno do dia 11/03 aprovou, por unanimidade, um projeto que congela a Gratificação de Técnico de Nível Superior (GTNS) dos servidores e outro – com apenas um voto – que revoga o Adicional por Tempo de Serviço (anuênio) da categoria, o que fez com que os trabalhadores deflagrassem o movimento paredista. Os projetos se encontram na Assembleia Legislativa, para apreciação dos deputados.

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