NOVO CD
— Se você analisar os compositores seculares, vai perceber que eles fizeram muita música religiosa sem saber. Ouve o samba-canção “O mundo é um moinho”, de Cartola... Quer coisa mais religiosa do que essa? E as obras de Gilberto Gil e Gonzaguinha?! Eles não tiveram a pretensão do discurso religioso, mas suas palavras têm naturalmente essa aura, propõem valores. São muitos os sambas do mundo que se pode cantar dentro da igreja. Por que não levar a religião até o samba também? — contrapõe Padre Fábio, que na juventude chegou a trabalhar como carnavalesco de uma agremiação de Formiga, cidade mineira onde nasceu.
Zeca Pagodinho, sambista e umbandista, canta com o padre na faixa “Amigo onde Deus é”. E usa os versos de “Se é pecado sambar”, clássico na voz de Beth Carvalho, para dar seu veredicto: “É legal ter um padre cantando samba porque ‘se sambar é pecado, Deus queira me perdoar’”. Candomblecista, Nana Caymmi faz dueto com Fábio de Melo na faixa-título do disco. A espírita Alcione, em “Sobre ganhar e perder”. Elba Ramalho e Fafá de Belém, católicas fervorosas, soltam a voz em “Oculto e revelado” e “O tempo não espera ninguém”, respectivamente. E Ninah Jo, adepta declarada da numerologia, em “Nós num só mundo”. O lançamento mostra-se, portanto, uma celebração ecumênica.
— Sei que são todos gente do bem, pessoas de caráter admirável. Isso, para mim, é o que prevalece. Embora rezemos em altares diferentes, professamos valores muito semelhantes. Por isso os quis no disco comigo — afirma o anfitrião, que, no entanto, não fez os convites pessoalmente: — É desconfortável abordar diretamente o outro artista, sobretudo quando o assunto é música. Acho que a pessoa tem que ter o direito de dizer não. Aí, através do produtor (José Milton) ficou mais fácil.
Das 14 faixas do CD, dez são inéditas, de autoria de Padre Fábio de Melo. As quatro restantes são regravações: “O vendedor de sonhos” e “Para eu parar de me doer” (Milton Nascimento/Fernando Brant), “Estrela luminosa” (Altay Veloso) e “Paciência” (Lenine/Dudu Falcão).
— Acredito nas letras dessas músicas. O que faz um bom compositor é sua espiritualidade, é o tanto que ele tem de alma. Eu me prendo aos espiritualizados porque religião não é garantia de nada, pode ser um envólucro em que cabe hipocrisia, mentira, falsidade — explica o padre.
Fã ardoroso de MPB desde criança, Fábio de Melo já se considera parte integrante dela.
— Depois desse disco eu posso tudo, né? Olha o time reunido! — brinca: — Agora, falando sério, esse trabalho me abre uma porta muito especial, faz muita diferença entrar por ela.
Padre e cantor, artista de sucesso, ele não se esconde dos holofotes. Há pouco mais de uma semana, por exemplo, gravou participação no “Estrelas”, programa sobre a vida de famosos (o quadro ainda não tem data para ir ao ar).
— Todo e qualquer veículo de comunicação em que eu tenha a oportunidade de expor os valores em que creio são benéficos, ainda que o nome do programa possa parecer contrário à minha opção de vida. Não tenho que ter medo da evidência, apenas cuidado com o modo como sou evidenciado — detalha o religioso, que na ocasião passeou num carro antigo com a apresentadora e fez a barba pela primeira vez numa barbearia: — Nunca tinha ido porque tenho pavor de navalha. Meu pai era barbeiro, eu o via trabalhar com lâmina e me dava um nervoso! Gostei da experiência, mas continua sendo um pouco agonizante.
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