A Operação Candeeiro, que desarticulou um esquema fraudulento que
desviou mais de R$ 30 milhões das contas do Instituto de Desenvolvimento
Sustentável e Meio Ambiente (Idema) entre 2012 e 2014, tomou novas
proporções ontem (22). Durante o depoimento mais aguardado, dentre os 15
réus, o ex-diretor administrativo do órgão, Gutson Johnson Giovany
Reinaldo, afirmou que o deputado estadual Ricardo Motta era o maior
beneficiado das fraudes.
O acusado, que seria da
cota de indicações do parlamentar no órgão, disse em juízo que Motta
recebia 60% dos recursos roubados dos cofres públicos. O deputado, em
nota, negou as alegações.
Gutson Reinaldo, que
ainda busca assinar um termo de delação premiada com o Ministério
Público, ainda afirmou ao juiz Guilherme Newton Pinto, titular da 6ª
Vara Criminal de Natal, haver tomado conhecimento da operação Candeeiro e
da operação Dama de Espadas pelo menos um mês antes de ambas serem
deflagradas pelos promotores.
A mãe dele, Rita
das Mercês Reinaldo, ex-procurdora-geral da Assembleia Legislativa do
Rio Grande do Norte, foi presa pela Dama de Espadas em agosto do ano
passado, 15 dias antes da operação Candeeiro, suspeita de desviar
recursos do Legislativo através de cheques-salário.
Conforme
o acusado, as informação partiram de dentro do próprio Ministério
Público, vazadas por pessoas ligadas a ele e a outro acusado, Clebson
Bezerril, ex-chefe da unidade instrumental de Finanças e Contabilidade.
Gutson relatou que foi indicado para assumir um cargo no órgão em 2011,
pelo então vice-governador, atual governador do estado, Robinson Faria.
“Depois
que teve o rompimento de Rosalba Ciarlini (então governadora) e
Robinson, foi Ricardo Motta quem me manteve lá”, afirmou. O ex-diretor
disse, então, que foi procurado pelo deputado, que exigia recursos. “Um
dia ele me chamou para conversar. Disse que precisava de R$ 8 a 10
milhões, porque tinha dívidas da eleição de 2010 e precisava de dinheiro
para a eleição de 2012”, afirmou.
Os novos fatos,
entretanto, não podem ser apurados na primeira instância da Justiça,
visto que o deputado tem foro privilegiado. A possível participação de
promotores ou funcionários do Ministério Público devem ser alvo de outra
investigação, ainda apontou o magistrado.
Durante
a audiência, Gutson também apresentou uma nova versão para a divisão
dos recursos desviados. “Eu ficava com 20% e 60% eu passava para o
agente político (como se referiu ao deputado, após já tê-lo
mencionado)”, disse ao juiz. Os outros 20%, apontou, eram divididos
entre os outros servidores do Idema que participavam da fraude (Clebson
José Bezerril, Euclides Paulino de Macedo Neto e João Eduardo de
Oliveira Soares) e os donos das empresas envolvidas. Durantes seus
depoimentos, entretanto, os ex-funcionários do órgão disseram que
dividiam 10% que ficavam para eles, não 20%.
Questionado
durante a audiência, pelo seu advogado Fabio Holanda, Gutson ainda
afirmou que as exigências por mais dinheiro aumentaram no período das
eleições de 2012. “Ele (o deputado) dizia que precisava de dinheiro para
cumprir compromissos políticos, que ele não estava conseguindo mais em
outros órgãos”, disse. Gutson ainda afirmou que se sentia pressionado a
enviar recursos, tendo inclusive que tomar remédios para se acalmar.
O
réu ainda garantiu que desconhecia como funcionava o esquema. Ele
apenas assinaria os ofícios usados para liberar os recursos do banco
para as empresas integrantes da fraude. Essas empresas, que não tinham
qualquer contrato com o Idema, devolviam o dinheiro ao grupo, para ser
rateado.
Conforme o depoimento, o ex-chefe do
setor financeiro Clebson Bezerril (que assinou acordo de delação
premiada), era o responsável pela parte técnica do esquema, sendo o que
melhor conhecia o Sistema Integrado de Administração Física e
Financeira.
Deputado nega participação
Em
nota, o deputado estadual Ricardo Motta negou as declarações de Gutson
Reinaldo e classificou as afirmações como caluniosas. Veja a nota
completa:
“Venho a público manifestar meu repúdio
diante de noticiário sobre declaração de ex-diretor do Idema citando de
forma espúria e sem provas o meu nome. Nada do que foi dito é verdade.
Nada, absolutamente, nada. Por isso, tomarei as medidas cabíveis para
que este absurdo não fique impune. Não fui responsável por sua
indicação, nomeação, tampouco pelos seus atos e jamais aceitarei a
calúnia cometida contra a minha pessoa. Que ele responda por suas
práticas, sem tentar macular a honra alheia ou maldosamente terceirizar
delitos que cometeu, numa desesperada e leviana manobra para transformar
quem nada tem com o caso, em boia de salvação do seu naufrágio moral.
Estive, estou e estarei à disposição da Justiça. Em sete mandatos de
deputado estadual jamais foi encontrada qualquer irregularidade em minha
vida pública. Estou, muito mais, com a paz, a serenidade e a firmeza
inabalável da consciência tranqüila”.
Defesa diz que provas serão apresentadas se houver delação
O
advogado Fábio Holanda, responsável pela defesa de Gutson Reinaldo,
afirmou que ele ainda tem interesse na delação premiada. De acordo com
ele, o seu cliente poderia apresentar provas testemunhais e os nove
telefones usados por ele à época, para que os investigadores peçam a
quebra do sigilo telefônico. “Era só checar as datas da liberação dos
recursos, as datas dos saques e as ligações do deputado pedindo
encontros”, afirmou.
Ainda de acordo com o
advogado, o réu poderia apresentar informações tanto sobre a operação
Candeeiro, quanto sobre a Dama de Espadas. De acordo com ele, Gutson
tinha conhecimento de grande parte do esquema na AL. “Resta saber se o
Ministério Público quer saber isso”, disse o advogado.
O
promotor de Justiça Paulo Batista Lopes Neto afirmou que as
investigações feitas até o momento não confirmavam a tese do réu. “Isso
tudo tem que ser avaliado à luz daquilo que se pode provar. O fato é que
em todo o processo, o nome do deputado Ricardo Motta não aparece em
nenhum depoimento formal. Isso tudo que está no processo até o momento
não dá suporte à tese”, apontou.
Apesar disso,
ele não descartou que ainda possa haver a delação premiada. De acordo
com o promotor, o acordo não foi fechado até agora, porque a defesa só
procurou os promotores na última segunda-feira (15). Para ele, na
ocasião não havia provas, nem tempo hábil para avaliar as declarações do
réu. “Ele diz que tem coisas a entregar. Quando o Ministério Público
receber isso, se ele ainda tiver interesse em fazer a delação, vai ter
que fazer um balizamento dessas provas para saber se há de fato
possibilidade de êxito em uma ação penal, ou numa investigação contra o
deputado”.
Acusados receberam informações vazadas de dentro do MP
Gutson
Reinaldo ainda disse durante seu depoimento à Justiça que soube das
duas operações (da que o prendeu e a Dama de Espadas, na ALRN) pelo
menos um mês antes de acontecerem, através de um ‘pai de santo” que ele
conheceu na casa da sua mãe, Rita das Mercês Reinaldo. Rita das Mercês
foi presa 15 dias antes do seu filho, suspeita de liderar um esquema de
desvios na Assembleia Legislativa do RN, onde era procuradora-geral,
durante a operação Dama de Espadas.
O “pai de
santo” identificado como Rafael Sobral Pinto virou sócio de uma das
empresas de Gutson após se envolver no esquema. Ele não foi acusado
pelos promotores. “Rafael avisou que ia acontecer. Ele conseguiu
subtrair alguns documentos de dentro do Ministério Público, porque ele
tinha uma boa circulação lá dentro”, disse. Ainda de acordo com o réu, o
homem seria um guru espiritual de sua família, de deputados e de alguns
membros do próprio MP.
Gutson também disse que
Clebson foi informado do esquema através de um informante, de dentro do
MP, conhecido apenas como Tony, que teria o alertado a respeito das
operações Dama de Espadas e Candeeiro. As informações haviam sido
compradas por Clebson, ao preço de R$ 20 mil.
De
acordo com o promotor Paulo Batista Lopes Neto, todas informações a
respeito dos possíveis vazamentos de dentro do Ministério Público serão
repassadas para a equipe do procurador-geral de Justiça e para o Grupo
de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado para que os fatos
sejam apurados.
Além de Gutson Reinaldo,
depuseram ontem (21) os réus Handerson Raniery Pereira, Elmo Pereira da
Silva Junior, Ramon Andrade Barcelar Felipe Sousa, Antônio Tavares Neto e
Euclides Paulino de Macedo Neto.
por: Igor Jácome/NOVO
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