REGALIA
A Câmara paga aposentadoria de
até R$ 23.344,70 por mês para deputados cassados. Os benefícios são
provenientes de um plano de previdência abastecido, em parte, com
recursos públicos. Nove parlamentares que perderam o mandato por
envolvimento em esquemas de corrupção ou improbidade administrativa
recebem os pagamentos mensais - o valor mais baixo é de R$ 8.775,38.
As aposentadorias somam R$ 126.960,94 por mês e seu pagamento não é
ilegal. Dos beneficiários desse montante, cinco deputados foram cassados
em razão do escândalo dos anões do Orçamento - grupo acusado de receber
propina de prefeitos e governadores em troca de liberação de recursos
da União nos anos 1990 - e dois por causa do mensalão - esquema de
compra de apoio político no Congresso, segundo a acusação, durante o
primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O petista José Dirceu, cassado em 2005 por envolvimento no mensalão e
agora condenado a 30 anos de prisão na Operação Lava Jato, pode ser o
próximo a receber o benefício. Na semana passada, a área técnica da
Câmara entendeu que o deputado cassado tem direito a aposentadoria de R$
9.646,57 por mês, conforme revelou a Coluna do Estadão. Caberá ao
presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), definir se Dirceu receberá ou
não o pagamento. Maia já disse que vai considerar o direito adquirido
do petista e não vai politizar a questão.
A decisão ocorrerá em
meio à retomada das articulações para a votação da reforma da
Previdência, que, segundo o governo Michel Temer, tem como um dos
objetivos eliminar privilégios e igualar direitos de servidores públicos
e trabalhadores da iniciativa privada. A expectativa do Palácio do
Planalto é de conseguir votar a proposta de emenda à Constituição (PEC)
na Câmara, mesmo que mais enxuta em relação ao texto inicial, até meados
de dezembro. Para a aprovação da reforma, são necessários 308 votos.
Além
dos pagamentos feitos aos parlamentares cassados, a Casa também reserva
uma pensão de R$ 937 à família de um deputado que era aposentado e
perdeu o mandato durante a ditadura militar.
Procurados, os
parlamentares cassados disseram que pagaram pelo direito de receber
aposentadoria e rechaçaram o rótulo de "privilegiados".
A maior
aposentadoria paga aos cassados é a do ex-deputado Roberto Jefferson
(PTB-RJ), que perdeu o mandato em 2005 no mensalão. Pedro Corrêa
(PP-PE), atualmente preso na Operação Lava Jato e cassado em 2006 também
no mensalão, recebe benefício de R$ 22.380,05.
Hoje, o teto da
Previdência Social para aposentadoria do trabalhador da iniciativa
privada, pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é de R$
5.531,31.
Regra
Até 1997, deputados e
senadores se valiam de um plano fechado de previdência com regras mais
benevolentes do que as atuais. Pelas normas antigas, do Instituto de
Previdência dos Congressistas (IPC), o deputado com oito anos de mandato
e idade mínima de 50 anos já podia pleitear o benefício. O valor da
aposentadoria era proporcional ao tempo de mandato. Se ele tivesse
completado o mínimo de oito anos, teria direito a 26% da remuneração
mensal de parlamentar.
Com o fim do IPC, extinto em 1999 depois de
registrar um rombo de R$ 520 milhões, a Câmara e o Senado ficaram
responsáveis diretamente pelo pagamento dos benefícios.
Atualmente,
parlamentares podem requerer a aposentadoria integral desde que
comprovem 35 anos de contribuição e 60 anos de idade. O Plano de
Seguridade Social dos Congressistas (PSSC) prevê o pagamento
proporcional de aposentadoria conforme o tempo de mandato. O salário de
um deputado é de R$ 33.763. Segundo o site da Câmara, só compensa a
adesão ao plano caso o parlamentar fique ao menos cinco anos no
exercício do mandato.
As contribuições funcionam com regras
semelhantes às das entidades de previdência privada, nas quais os
participantes pagam uma cota e a entidade patrocinadora contribui com
uma cota equivalente. No caso, o valor atual da contribuição do deputado
ao PSSC é de R$ 3.713,93 (11% da remuneração atual) e a Câmara entra
com uma cota de igual valor, retirada do orçamento público.
Direito de receber
Deputados
cassados aposentados pela Câmara afirmaram que pagaram pelo direito de
receber os benefícios e rechaçaram o rótulo de "privilegiados".
"Contribui todo mês", disse Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que perdeu o
mandato durante o escândalo dos anões do Orçamento.
Ele é um do
caso dos parlamentares que se aposentaram com as regras do plano antigo,
mais benevolente aos deputados. Hoje deputado estadual no Rio Grande do
Sul, Ibsen Pinheiro recebe aposentadoria de R$ 12.070,27 por mês. O
peemedebista cumpriu quatro mandatos e pagou o plano de previdência nos
três primeiros. O deputado destacou que seu benefício é proveniente de
um fundo privado.
Jerônimo Reis (PMDB-SE) foi cassado em 2010 por
improbidade administrativa e recebe R$ 18.690,24. Segundo o deputado
cassado, foram três mandatos de contribuição com parcelas superiores a
R$ 3 mil. O ex-parlamentar defende a reforma do sistema previdenciário.
"A gente sabe que a nossa Previdência não aguenta", disse Reis.
Hoje
comerciante no município de Lagarto (SE), Reis não se considera um
privilegiado. "Para mim não foi privilégio, eu paguei um valor alto.
Esse fundo foi criado para parlamentares, foi oferecido desde o primeiro
mandato. Não é uma Previdência pública, foi criada pela Câmara",
enfatizou.
Reis também concorda com a concessão do benefício a Dirceu. "Se ele tem direito, é um direito", afirmou.
Maior
beneficiário entre o grupo de deputados cassados, Roberto Jefferson
(PTB) afirmou que prestou serviços como deputado por 24 anos e
contribuiu para o plano durante todo o período. Antes de assumir a
função, Jefferson explicou que contribuiu por 20 anos para o Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS) como empregado da iniciativa privada e
autônomo. Seu benefício é maior, segundo sua assessoria de imprensa,
porque ele se aposentou por motivo de doença e por isso não recolhe
Imposto de Renda.
Algoz de Dirceu no escândalo do mensalão,
Jefferson também demonstrou concordar com o pleito do petista. "Por que
seria diferente para o ex-ministro José Dirceu, se ele contribuiu de
fato para o INSS como deputado?", respondeu via assessoria de imprensa. O
Estadão/Broadcast procurou os outros ex-parlamentares, mas não
conseguiu localizá-los.
Pensão
A única
pensão paga pela Câmara a parlamentar cassado com direito a
aposentadoria é para viúva de Francisco Pinto (MDB-BA), morto em 2008.
Durante o regime militar, ele foi condenado pelo Supremo Tribunal
Federal (STF) a seis meses de detenção e perda dos direitos políticos
por "ofensa moral" ao general Augusto Pinochet, ditador chileno.
Pinochet estava no Brasil para a posse do general Ernesto Geisel, em 15
de março de 1974.
O parlamentar perdeu o mandato por ter feito um
discurso criticando a presença de Pinochet no País. Era a primeira
viagem do ditador chileno ao exterior desde o golpe de 1973 que derrubou
o governo de Salvador Allende no país vizinho.
Na véspera da
posse de Geisel, o deputado, conhecido pelos colegas como Chico Pinto,
foi à tribuna da Câmara criticar a ditadura chilena. "Para que não lhe
pareça, contudo, que no Brasil todos estão silenciosos e felizes com sua
presença, falo pelos que não podem falar, clamo e protesto por muitos
que gostariam de reclamar e gritar nas ruas contra a sua presença em
nosso País", discursou.
O STF condenou Chico Pinto por
insulto um chefe de Estado estrangeiro. Ele voltou à Câmara em fevereiro
de 1979, após ser eleito no ano anterior. Foi reeleito em 1982 e, em
1984, votou a favor da emenda Dante de Oliveira, que previa o
restabelecimento das eleições diretas. A viúva de Chico Pinto, Thaís
Alencar, não foi encontrada pelo Estadão/Broadcast para comentar o
assunto. Ela recebe R$ 937 por mês.
(informações são do jornal O Estado de S. Paulo)
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