Veículos em chamas após ataque em Fortaleza (Alex Gomes/O Povo/AP)
Veículos são vistos queimados em pátio de Fortaleza (CE), após violentos ataques serem reportados na região - 07/01/2019 (Paulo Whitaker/Reuters)
Pichação em muro pede a saída do secretário de Administração Penitenciária do Ceará, Luís Mauro Albuquerque em Fortaleza - 07/01/2019 (Paulo Whitaker/Reuters)
Membros da Força Nacional da Segurança fazem patrulha próximo de terminal de ônibus em Fortaleza (CE) - 08/01/2019 (Paulo Whitaker/Reuters)
A onda de violência que assola o Ceará chegou nesta terça-feira, 8, ao sétimo dia. Segundo a última parcial divulgada pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Pública (SSPDS-CE), 185 pessoas já foram presas por envolvimento em atos criminosos no período. Desses, 29 são adolescentes.
O governo não possui um balanço oficial sobre o número de ataques. Em levantamento próprio, o jornal O Estado de S. Paulo apurou 180 ocorrências.
Em ocorrências da terça-feira, criminosos
explodiram uma ponte no km 6 da BR-222, no bairro São Geraldo, em
Caucaia, a 18 km de Fortaleza. Ônibus foram incendiados na capital e no
interior. Além dos crimes contra veículos e prédios públicos, foram
registradas ao longo dos últimos sete dias 14 atuações por coações a
comerciantes.
Bombeiros tentam conter incêndio em um imóvel do Sistema Nacional de
Emprego (SINE) que servia de arquivo no bairro Barra do Ceará, periferia
de Fortaleza. Já passa de 80 o número de ataques criminosos registrados
em Fortaleza, região metropolitana e interior - 05/01/2019 (Jarbas Oliveira/Folhapress)
Policiais fazem escoltas de ônibus após onda de ataques em Fortaleza, no Ceará - 03/01/2019 (Jarbas Oliveira/Folhapress)
Caminhão fica completamente destruído após ser incendiado por criminosos
durante onda de ataques em Fortaleza, Ceará - 07/01/2018 (Paulo Whitaker/Reuters)
A onda de violência também abrange o interior dos presídios. Até o
momento, foram contabilizados casos de 191 detentos envolvidos em crimes
de desobediência, resistência e motim, segundo a Polícia Civil. Na segunda-fera 7, 23 presos fugiram da Cadeia
Pública de Pacoti, cidade a 103 quilômetros da capital, Fortaleza. A
fuga ocorreu de manhã, durante o banho de sol, quando os detentos
pularam o muro da cadeia e tiveram acesso à área externa.
A Secretaria de Administração Penitenciária afirma, ainda, que 20 líderes de facções foram transferidos para presídios federais.
Governador se pronuncia
Na noite desta terça-feira 8, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), se reuniu com representantes de órgãos de segurança, na sede da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).
“Circulei pelas ruas de Fortaleza durante
a tarde para conversar com nossos policiais, que têm sido guerreiros no
combate ao crime, e com nossa população, a razão maior da nossa
missão”, declarou Santana em suas redes sociais.
Reforços chegam de diversas partes do país para combater a crise. Na
noite da segunda 7, começaram a desembarcar em Fortaleza 200 policias da
Força Nacional que se juntaram aos 300 que já atuam no estado desde o
final de semana. Três estados (Pernambuco, Piauí e Santa Catarina)
também se prontificaram a enviar um total de 43 policiais e agentes de
inteligência para apoiarem as forças de segurança. O estado da Bahia foi
o primeiro a colaborar, com envio de 100 policiais militares do
Batalhão de Choque para o Ceará.
Onda de boatos
A onda de violência tem sido marcada por
boatos de toque de recolher supostamente ordenado pelo estado, além de
comprometimento aos serviços essenciais, como coleta de lixo e
transporte. O sindicato dos médicos orientou os profissionais a não
trabalharem até que os ataques cessem. Com medo, comerciantes estão
fechando as lojas.
A Secretaria de Segurança Pública e
Defesa Social do Ceará publicou comunicado para acalmar a população
negando ter adotado toque de recolher. Também se espalham nas redes
sociais boatos de ataques a lojas que permanecem abertas. A pasta
classificou os boatos de “prática criminosa” e disse que a estratégia é a
“reação encontrada por criminosos às ações das forças de segurança do
Estado e do governo federal”.
Com medo, comerciantes estão fechando as
portas mais cedo. Segundo a secretaria, foram detidos 11 adultos e três
adolescentes pela distribuição de panfletos com ameaças a comerciantes
na Grande Fortaleza.
Na capital, a coleta de resíduos está
prejudicada. Nos bairros Centro, Benfica, Damas e Montese há amontoados
de lixo. Uma moradora de Benfica, que não se identificou por temer
represália, contou que o caminhão de lixo até passou nos dias corretos,
mas os lixeiros não desceram do veículo. A prefeitura disse se esforçar
para manter os serviços essenciais.
Transporte público
A circulação de ônibus continua
prejudicada, apesar das medidas adotadas pelos governos, como a
colocação de policiais dentro dos coletivos. “O ônibus que eu pego
demora dez minutos para passar, mas hoje (terça) esperei 40 minutos. No
terminal, peguei outro e em nenhum dos dois vi PM, a não ser que eles
estivessem à paisana”, diz o estudante Samuel Sousa. Segundo o governo,
há policiais fardados e à paisana nos coletivos.
Moradora do Bom Jardim, na periferia de
Fortaleza, a atendente de telemarketing Ana Paula Mendes relatou que os
ônibus têm alterado os itinerários. “O ônibus que passava do lado da
minha casa, já não passa nem na minha rua. Sem contar que, quando
começam a queimar os ônibus, eles recolhem tudo e as pessoas ficam
esperando nos terminais e nas paradas, sem saber se ainda vai passar ou
não.”
Segundo o Sindionibus,
quando há denúncia ou ameaça de atentado contra os veículos, é feita
avaliação pela Secretaria da Segurança sobre os riscos, e isso pode
desencadear atrasos.
Também nesta terça, a Companhia Cearense
de Transportes Metropolitanos informou, por nota, a suspensão temporária
das linhas Sul, Oeste e do VLT Parangaba-Mucuripe, a partir das 20
horas, por motivos de segurança.
O Sindicato dos Médicos do Ceará divulgou
comunicado aos profissionais recomendando que eles não compareçam ao
trabalho enquanto a violência perdurar. Também ofereceu apoio jurídico e
oficiou prefeituras e o Estado sobre a decisão. Para tentar evitar as
faltas, a Secretaria de Saúde de Fortaleza disse nesta terça que os
servidores dos postos de saúde que faltarem terão o ponto cortado com
desconto salarial.
Especialistas criticam ação do governo no Ceará e sugerem rastreamento do dinheiro das facções
Especialistas das áreas criminal e constitucional criticaram as ações do Estado do Ceará contra as organizações criminosas. “Infelizmente
a situação se agrava pela falta de corretas políticas de segurança
durante os últimos anos nesses estados. Não se pode combater o crime sem
o devido preparo, sem estratégia e com o que há de mais moderno e
eficiente. O enfrentamento é consequência disso e não adiantam medidas
paliativas. É necessário o combate ostensivo para restabelecer a ordem,
mas sobremaneira planejar ações coordenadas e preventivas”, afirma o
criminalista Daniel Leon Bialski.
Para a advogada constitucionalista Vera Chemim,
os governos municipal, estadual e federal deveriam agir em ações
integradas para neutralizar os criminosos. Chemim também defende o
rastreamento do dinheiro das facções, para enfraquecê-las, diminuindo
seu poder em influência. “Por outro lado, é necessário que se invista na
educação, operacionalizando ações voltadas ao efetivo acesso das
comunidades carentes ao ensino e ao mesmo tempo criar mecanismos que
possibilitem a inclusão dessas pessoas no mercado de trabalho”,
completou a advogada.
O advogado criminalista e constitucionalista Adib
Abdouni criticou o envio repetido da Força Nacional a estados com crise
de segurança. “Isso resulta de uma precária ação política, a fim de
responder de forma instantânea ao clamor da sociedade e da imprensa,
cujos efeitos ostentam evidente efeito meramente paliativo”, criticou
Abdouni. “O momento exige a adoção urgente de medidas que modernizem o
aparelho estatal e tornem a gestão do serviço público mais eficiente,
com aporte definitivo de investimentos em tecnologia e inteligência das
forças policiais, mediante a integração e cooperação das polícias dos
estados, melhoramento das unidades prisionais, além da informatização
unificada dos dados sobre a população penitenciária.”
(com Estadão Conteúdo)
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