APOSENTADORIA
Celso de Mello - Nelson Jr/STF
O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de
Mello, informou nesta sexta-feira à Corte que vai deixar o tribunal no
dia 13 de outubro, segundo o Estadão apurou. Relator do inquérito que
investiga se o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente
na Polícia Federal, o ministro completa 75 anos em 1º de novembro,
quando se aposentaria de forma compulsória.
Na prática, a decisão de Mello antecipa o seu
desligamento do STF em três semanas, abrindo a primeira vaga na Corte
para indicação de Bolsonaro. Hoje, o favorito para a cadeira do decano é
o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira.
Amigo do presidente da República, Jorge Oliveira
possui uma relação íntima com Bolsonaro e é visto como um nome que
defenderia o seu legado, evitando frustrações que outros ex-presidentes
tiveram com suas escolhas para a Corte. O ex-presidente Luiz Inácio
Lula, por exemplo, se decepcionou com a indicação de Joaquim Barbosa,
considerado algoz do PT no julgamento do mensalão.
Bolsonaro pretende dar uma "guinada conservadora" na
escolha das duas vagas de ministros do STF que serão abertas no seu
mandato - depois de Celso, o próximo a se aposentar é o ministro Marco
Aurélio Mello, em julho de 2021.
No cálculo político feito pelos aliados do
presidente, é considerada decisiva na definição dos nomes a posição
contrária dos postulantes ao cargo à chamada "pauta de costumes", como a
descriminalização das drogas e do aborto. Para o Palácio do Planalto, o
STF possui atualmente um perfil "progressista", o que pode ser mudado
agora.
Celso de Mello retornou ao trabalho nesta
sexta-feira, após uma licença médica. O afastamento inicialmente estava
previsto até este sábado, mas foi encerrado na quinta.
Inquérito
A antecipação da aposentadoria compulsória de Celso
de Mello, no início de novembro, reacendeu na Corte a discussão sobre
quem deve assumir a relatoria do caso. Segundo o Estadão apurou,
integrantes do STF se dividem sobre o tema.
"Ante a urgência de todo e qualquer inquérito, de
todo e qualquer processo-crime, há de ser distribuído (a outro
ministro). Não aceito simplesmente herdar", disse no último domingo
Marco Aurélio Mello ao Estadão, ao defender um sorteio eletrônico para
definir o novo relator do caso, após a saída de Celso de Mello. "Sou
substituto do ministro Celso de Mello, não pelo patronímico Mello, mas
por antiguidade, enquanto ele integrar o tribunal. E não aceito
designação a dedo. Mas, como os tempos são estranhos, tudo é possível."
Coube a Marco Aurélio decidir sobre o recurso de
Bolsonaro para suspender o depoimento presencial por conta da licença
médica do decano.
O regimento interno do STF prevê que, em caso de aposentadoria do relator, o processo é herdado pelo ministro que assume a vaga.
Dessa forma, o nome que vier a ser escolhido por
Bolsonaro deve assumir o acervo de processos de Celso de Mello - o que
abre margem para a insólita situação de um ministro indicado pelo chefe
do Executivo assumir a relatoria de um inquérito que investiga o próprio
presidente da República.
"Seria muito ruim que o presidente estivesse na
posição de nomear o ministro ou ministra que assumiria a relatoria de um
inquérito contra ele. Se essa situação acontecer, espero que o Senado
questione o indicado ou indicada sobre isso e, idealmente, perguntaria
se ele ou ela se comprometeria em se declarar sua suspeição e pedir a
redistribuição caso isso ocorresse", avaliou o professor Thomaz Pereira,
da FGV Direito Rio.
"Mas o melhor seria que o inquérito fosse
redistribuído antes disso, para esse debate não dominar a conversa em
torno da nomeação, ofuscando outros temas de grande importância."
Desgastes
Para o Palácio do Planalto, Celso de Mello se
converteu em um militante político contra o governo. Desde que Bolsonaro
assumiu a Presidência da República, o decano se tornou um dos
principais contrapontos do chefe do Executivo no STF, com manifestações
contundentes de repúdio ao que considera excessos cometidos pelo
presidente - e de defesa da democracia.
Celso já disse que Bolsonaro "degrada" o Parlamento e
"minimiza perigosamente" a importância da Constituição, e criticou a
fala do presidente de indicar um nome "terrivelmente evangélico" para a
Corte.
Entre as decisões do STF que contrariaram o Planalto
ao longo dos últimos meses, estão a suspensão da nomeação de Alexandre
Ramagem para a chefia da PF, a autonomia para Estados e municípios
tomarem medidas para enfrentar a pandemia, a criminalização da
homofobia, a manutenção da demarcação de terras indígenas com a Funai e a
proibição de extinguir conselhos criados por lei. Ainda aguardam
julgamento na Corte ações caras à pauta de costumes, como a
descriminalização da maconha (julgamento marcado para o ano passado, mas
adiado sem definição) e do aborto, além da reforma da Previdência.
"Tenho convicção de que o presidente Bolsonaro
escolherá uma pessoa conservadora nos costumes e que vai praticar a
retidão da Justiça estabelecida na nossa Constituição", disse o deputado
Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), da bancada evangélica, uma das bases de
sustentação do presidente no Congresso. Nos bastidores, o nome do juiz
federal William Douglas, de Niterói, é visto com bons olhos por parte
dos evangélicos, mas ele divide a torcida com o ministro da Justiça,
André Mendonça, que é presbiteriano. Não há um consenso entre os
parlamentares.
(Por:Estadão Conteúdo)
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