REVOLTA
Na
tarde de 9 de agosto de 2014, após ser chamado para atender uma
ocorrência de furto em uma loja, o oficial norte-americano Darren Wilson
abordou o jovem negro Michael Brown, de 18 anos, que
caminhava ao lado de um amigo. Dois minutos depois, após pouco diálogo,
luta corporal e seis disparos, Brown estava morto. O episódio trouxe
revolta e protestos à suburbana
cidade de Ferguson, no estado do Missouri, e, nos Estados Unidos em
geral, levantou a discussão sobre os deliberados assassinatos pelas mãos
das forças policiais americanas, principalmente de jovens negros.
Nesta semana, novamente o município de pouco mais de 20 mil habitantes
entrou em ebulição. Motivada pela decisão de um grande júri, que optou
por não indiciar o agente Wilson pelo crime, a população de Ferguson voltou às ruas exigindo justiça e um tratamento igualitário aos negros do estado. O
preconceito inerente às abordagens policiais não pode ser constatado
por levantamentos sobre mortes em ações oficiais, simplesmente porque
tais dados não existem. O máximo
que se dispõe publicamente, em divulgação do FBI, são os "homicídios
justificáveis", que crescem desde o início dos anos 2000 – em 2013 foram
461 mortes. Sem uma
base de dados nacional, que possa coletar números pelas diversas
entidades que atuam na segurança do país, a comprovação dos ocorridos é
feita no dia a dia, em casos como o de Michael Brown.
Ferguson
não foi a primeira cidade a se rebelar contra a polícia após o
assassinato de um homem negro e desarmado. Um mês antes da morte de
Brown, Nova York testemunhou
um caso de abuso policial. Eric Garner fora abordado por um policial à
paisana, em suspeita de vender cigarros ilegalmente. No momento em que
seria algemado,
seis oficiais utilizaram de força excessiva para conter Garner,
ignorando suas súplicas por não conseguir respirar. Imobilizado pelos
agentes, o homem de 43 anos
e que sofria de asma, morreu no próprio local. Protestos pacíficos
foram organizados na Times Square e em Staten Island, local do ocorrido.
A família de Garner processa a cidade de Nova York, sua polícia e os seis agentes envolvidos na ação. O caso ainda não foi julgado.
Do outro lado do país, na Califórnia, episódios similares não são
raridade. No início de 2009, a segurança do BART (sistema de trens
rápidos da baía de
São Francisco) foi chamada para averiguar uma aglomeração na estação de
Fruitvale, na região de Oakland. Vários jovens foram detidos e
permaneceram na plataforma. Dada
a truculência da polícia, muitas pessoas começaram a filmar a ação com
seus celulares. Entre insultos e agressões, Oscar Grant, 22 anos e
negro, foi deitado de bruços, algemado e alvejado nas costas pelo agente Johannes Mehserle. Grant morreu na manhã seguinte.
A
população local foi às ruas nas semanas seguintes e realizou
manifestações, tanto pacíficas quanto violentas. O caso ganhou o
noticiário e, apesar de defesas incosistentes
– como a alegação de que houve confusão na hora de sacar a arma (o
objetivo, segundo a defesa, era imobilizar o já imobilizado jovem com
uma pistola
de eletrochoque) –, Mehserle foi para a cadeia. Onze meses depois Johannes estava em liberdade e sua dívida com a sociedade, paga.
Um dos pontos reclamados pela população negra de regiões suburbanas dos
Estados Unidos, durante esses protestos, é o teor racista das
abordagens da polícia norte-americana, prioritariamente branca. Levantamento feito pelo jornal Washington Post, utilizando dados do censo do efetivo policial de 2010, mostra que, mesmo em cidades com
população minoritariamente branca, as forças policiais são formadas, em
sua maioria, por oficiais brancos. Na Flórida, por exemplo, a
cidade-satélite Miami Gardens, a quarenta minutos de Miami, tem apenas
3% de população branca. Já na polícia, esse número sobe para 70% do
efetivo. Tal realidade não necessariamente explica as mortes dos jovens
negros. Mas evidencia a falta de representatividade da população em sua
polícia local.
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