As autoridades das áreas de segurança e recursos hídricos do
Rio Grande do Norte estão preocupadas com uma onda de protestos que
poderá surgir nos próximos meses devido à falta de abastecimento de água
nos municípios potiguares. A situação do sistema hídrico se agrava
ainda mais neste quinto ano consecutivo de seca, quando, sem recargas,
67% dos reservatórios já se encontram secos ou em volume morto. O estado
só tem 16,6% de sua capacidade de armazenamento do líquido.
Se
as chuvas não forem suficientes, 90% dos açudes potiguares estarão pelo
menos no volume morto até junho. As expectativas quanto a isto não são
das mais otimistas.
Conforme a Companhia de Águas e Esgotos do
Rio Grande do Norte (Caern), 17 municípios estão em colapso de
abastecimento e outras 74 cidades passam por rodízio. Algumas, como é o
caso de São José do Seridó, recebe o líquido durante um dia e passa
outros três sem nada nas torneiras.
O número de
cidades em colapso ou no sistema de rodízio representa 54% dos
municípios potiguares. O presidente da companhia, Marcelo Toscano,
confirma que outros entrarão na mesma situação, dentro de alguns meses,
caso o quadro não se reverta.
Numa reunião entre
representantes da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Secretaria Estadual
de Segurança Pública (Sesed), Secretaria de Meio Ambiente e Recursos
Hídricos (Semarh), além do Instituto de Gestão das Águas do Rio Grande
do Norte (Igarn), realizada ontem (12) no Centro Administrativo, foi
discutida a possibilidade da ocorrência de ebulição social no interior
do estado causada pela falta de água.
De acordo
com a Superintendência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), a corporação
apresentou informações a respeito da última manifestação ocorrida na
última sexta-feira (8), que interditou uma via em Angicos e recebeu dos
órgãos estaduais informações a respeito dos possíveis riscos,
especialmente nas áreas próximas às BRs.
Os
representantes dos órgãos de gestão hídrica apresentaram um quadro geral
aos representantes da segurança pública. A reportagem não teve acesso
ao encontro. “Passamos o panorama de uma situação que já existe, algumas
manifestações que estão acontecendo”, confirmou Marcelo Toscano. Ele
informou que o objetivo do encontro foi preparar os agentes de segurança
pública para casos que venham a ocorrer.
“A
gente vai ter problemas sociais muito graves para enfrentar daqui para
frente”, afirmou ao NOVO o secretário de Recursos Hídricos, Mairton
França, ressaltando que grandes cidades do estado poderão deixar de ser
abastecidas.
Após cinco anos de estiagem, os
gestores dos recursos hídricos se vêem cada vez mais sem opções para
conseguir manter o abastecimento. Por enquanto, a medida encontrada é
perfurar poços.
A operação carro-pipa executada
pelo Exército brasileiro na zona rural atende a 122 municípios do
estado. Quando as zonas urbanas entram em colapso – ou seja, deixam de
integrar a rede da Caern por falta de condições de abastecimento – a
responsabilidade pelo socorro, pelo menos na entrega de água para
consumo humano, passa a ser da Defesa Civil.
A
Casa Civil do governo do estado, comandada por Tatiana Mendes Cunha,
encabeça um plano emergencial praticamente pronto para atender a
necessidade de consumo humano nesse contexto. Mas falta dinheiro. No dia
30 de janeiro do ano passado, o governo apresentou o projeto ao governo
federal solicitando R$ 60 milhões para ações emergenciais.
Em
julho, o governo estadual enviou outro pedido demandando entre R$ 62 e
63 milhões. Ainda em 2015 o Planalto liberou R$ 4 milhões, referentes ao
primeiro projeto apresentado, para serem utilizados na operação
carro-pipa nas zonas urbanas. O detalhe é que esse recurso até hoje não
foi depositado nas contas do governo estadual.
Dessa
forma, a Defesa Civil, segundo confirmou Tatiana Mendes Cunha, ainda
não começou a atuar sequer nas 17 cidades já em colapso. “A
responsabilidade é dos municípios, mas o estado tem ajudado como pode”,
disse.
Plano emergencial de segurança hídrica
O
secretário de Recursos Hídricos do RN, Mairton França, afirmou que o
estado conta com um plano emergencial de segurança hídrica, que prevê
perfuração de poços e construção de adutoras. Poços de grande vazão,
perfurados acima do aflorante arenito Açu, com capacidade de vazão de
100 a 120 metros cúbicos por hora, devem ser instalados em várias
regiões.
O secretário não precisou quantidades.
Vai variar, esclareceu, de acordo com a necessidade. Em cada região, há
medidas pontuais, de acordo com ele. Apesar de o governo federal não ter
enviado recursos, em reunião realizada no segundo semestre do ano
passado com os governadores dos estados mais afetados pela estiagem (Rio
Grande do Norte, Ceará, Pernambuco e Paraíba), a presidente Dilma
Rousseff “sinalizou que iria liberar recursos para algumas linhas
específicas, como poços de grande vazão”.
Esses
poços devem abduzir águas para adutoras que estão com problemas para
captar água de açudes. Desta forma, a pressão sobre os reservatórios
diminui, lembra França. A Caern construiu cerca de 10 desses poços na
região de Afonso Bezerra até Angicos, aliviando, em parte, a região
central-cabugi. Em Apodi foram cinco. Essa água também deverá ajudar na
captação de água aproveitada pelos carros-pipa.
Já
a região de Caicó, que é outra área preocupante para o estado, já teve
pré-aprovado um projeto de adutora de engate-rápido que sairia de
Florânia, na adutora de Serra de Santana. De acordo com ele, a ideia é
concluir o projeto no mais tardar entre maio e junho, quando se prevê
que a cidade ficará sem água.
Na avaliação do
governo, a barragem Armando Ribeiro Gonçalves, que tem cerca de 20% de
sua capacidade e é uma das que está em melhores condições, ainda
“agüenta” ir até o final de outubro ou início de novembro.
“A
gente vai esperar a chuva deste ano para ver como vai ser a recarga
desses reservatórios. A adutora do Alto Oeste está praticamente pronta,
com previsão de inauguração ainda no primeiro trimestre de 2016 e ela
vai atender 10 municípios da região do Alto Oeste, vários com problemas
de abastecimento, como é o caso de Martins, que será atendida
indiretamente”, ainda disse o secretário.
Itaú, na semana passada, foi religada ao sistema, após colapso, graças a ligação à adutora.
Alternativas de longo prazo
Apesar
da previsão de mais um ano de seca, de acordo com a Empresa de
Pesquisas Agropecuárias do Rio Grande do Norte (Emparn), a chuva é
extremamente importante para a normalização do sistema no estado, de
acordo com Mairton França. Isso porque “o sistema de recursos hídricos
do estado foi montado para se abastecer a partir de reservação de
chuva”.
“Estamos modificando essa lógica,
pensando em outras alternativas de produção de água, como é o caso de
água subterrânea, poços profundos e de grande vazão e usinas de
dessalinização”, salientou.
Sobre as usinas –
sobre as quais o NOVO publicou reportagem em 2015 – o governo tem um
posicionamento favorável do Banco Mundial e agora analisa tecnicamente e
economicamente a viabilidade da usina. Trata-se de uma água mais cara. A
ideia é primeiro construir projetos piloto. Essa alternativa, porém,
faz parte de uma ação de longo prazo.
Segundo a
Lei Orçamentária de 2016, a secretaria dispõe de apenas R$ 90 milhões,
cuja maior parte está destinada à conclusão da barragem de Oiticica. “É a
principal obra do estado”, defendeu o secretário.
Qualidade caiu
Uma
portaria publicada pelo Igarn no Diário Oficial do Estado restringiu o
uso da água do sistema sertão-central cabugi, que abastece oito cidades
potiguares. O uso para irrigação, por exemplo, está proibido. De acordo
com o diretor-presidente do órgão, Josivan Cardoso, o estado precisará
entrar em racionamento em todas as áreas. “É preciso fiscalizar mais,
fazer rodízio. E a população tem que entender que a água tem que ser
usada de forma racional”, defendeu.
Ele explicou
que a qualidade da água no estado diminuiu, porque quando há queda da
quantidade a diluição dos contaminantes e poluentes, além do sistema
ambiental, fica dificultada. “Existem reservatórios que já tem a água
comprometida, mas que pode passar por tratamento e ser usada”,
concluiu.
por: Igor Jácome
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