ESTUPRO NO RIO DE JANEIRO
Inoportuna, abominável e machista. Foi assim que a pergunta feita
pelo delegado Alessandro Thiers à adolescente vítima de estupro coletivo
foi tratada por advogados criminalistas ouvidos, ontem, pelo EXTRA.
Segundo a advogada da vítima Eloisa Samy Santiago, o titular da
Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI) questionou se a
jovem, de 16 anos, tinha por hábito fazer sexo em grupo. Para os
criminalistas, essa postura tende a transferir a culpa para a vítima.
—
Uma das principais queixas das vítimas de violência sexual é justamente
essa falta de acolhimento por parte da polícia, que tende a tratar a
pessoa agredida como uma suspeita — apontou Luciana Boiteux, professora
de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Após
encerrar o depoimento da vítima antes do fim, a advogada Eloisa pediu a
saída de Alessandro do caso. Na sexta-feira, Thiers chegou a falar, em
coletiva, que ainda estava “investigando se houve consentimento dela, se
ela estava dopada e se realmente os fatos aconteceram”.
— Quando
você tem o próprio delegado criminalizando a vítima, você entende por
que tantas mulheres deixam de levar ao conhecimento das autoridades as
denúncias sobre abuso sexual e violência — disse Eloisa.
Em nota, a
Polícia Civil afirmou que a investigação é conduzida de “forma técnica e
imparcial”, mesmo argumento usado por Thiers ao jornal “O Globo”:
—
A investigação é técnica. Tudo o que está sendo levantado tem
coerência. Estamos buscando informações. Todos os fatos estão sendo
investigados. O que ainda não foi passado até agora é porque ainda não
há conclusão — disse Thiers.
O professor de Direito Penal da Universidade Cândido Mendes Rafael Faria, porém, aponta que o vídeo prova o estupro.
—
Fazer sexo é saudável, e se é com uma pessoa ou grupal não compete a
ninguém. O problema é ser feito sem consentimento. (Pelo vídeo) Ela não
tinha capacidade de dizer sim ou não à prática sexual, seja por uma
embriaguez, uma dopagem ou um remédio dado pelo grupo. Logo, ela foi
estuprada e teve sua vulnerabilidade atingida.
Para Luciana
Boiteux, a versão de que a vítima teria concordado com o sexo grupal
anteriormente não se sustenta e nem inviabiliza a acusação de estupro.
—
O fato de ela estar desacordada já configura estupro, independentemente
de qualquer questão que tenha acontecido antes. Mas eu insisto que,
para mim, isso é uma grande mentira contada em defesa dos acusados. E
uma mentira típica de uma sociedade machista, prática comum nesses
processos de crimes sexuais.
Presidente da Comissão de Segurança
Pública e Assuntos de Polícia da Assembleia Legislativa do Rio de
Janeiro (Alerj), a deputada estadual Martha Rocha (PDT) também criticou a
indefinição de Thiers sobre o caso. Ela disse que as declarações sobre
ainda não ser possível dizer se houve consentimento é uma das razões
para mulheres deixarem de denunciar casos de abuso sexual e violência.
Participação da Deam é pedida
Na
mesma nota, a deputada Matha Rocha lamentou que a investigação não
conte com a participação da Delegacia Especializada no Atendimento à
Mulher (Deam). A professora Luciana concorda que seria a melhor medida:
—
A vítima merece todo respeito, cuidado, apoio, especialmente nesse
caso, que foi um trauma muito grande. Tem que ser protegida. Eu acho,
inclusive, que esse caso deveria ir para a Delegacia da Mulher, que é
onde há maiores condições de assistência — defendeu.
por:Extra.Globo
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