quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Meios de comunicação e jornalistas estão perdendo a paciência com milícias virtuais. Isto não é bom para o país

MILÍCIAS VIRTUAIS
 

Não como ignorar as inúmeras reclamações de alguns jornalistas e meios de comunicação sobre a agressividade de determinados grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro nas Redes Sociais e nas áreas de cometários dos órgãos de imprensa.
Vários jornalistas, inclusive muitos que se mantiveram neutros ou apoiaram Bolsonaro de forma discreta, já foram vítimas de hostilidades por parte de apoiadores do presidente. A reação exacerbada e agressiva por parte de apoiadores de Bolsonaro ocorre mesmo em casos de notas inofensivas, sem qualquer relevância. As áreas de comentários de sites de notícias são invadidas por estes grupos sempre que surge qualquer notícia sobre o governo. Muitos comemoram efusivamente medidas relacionadas à decisões do governo anterior, parecendo ignorar que o governo começou há poucos dias.

Este foi o caso do uso do Exército para a duplicação de um trecho da BR-116 entre Guaíba e Barra do Ribeiro, no Rio Grande do Sul. O custo de duplicação do trecho de 50 quilômetros foi estimado em R$ 190 milhões quando o contrato foi assinado em meados do ano passado durante o governo Temer. A previsão de término da obra ficou para 2022. A empresa que estava responsável pela obra enfrentava um processo de recuperação judicial e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) da administração anterior decidiu romper o contrato e colocar o Exército na obra.

Apesar dos fatos, os vigilantes da imprensa que defendem o governo Bolsonaro de forma muitas vezes irascível, costumam atuar de forma ostensiva, patrulhando jornalistas e meios de comunicação. Ao menor sinal de crítica contra o presidente ou seus filhos, logo surgem comentários recheados de palavrões, xingamentos e ironias.

O comportamento ordenado observado durante a campanha eleitoral perdura até os dias de hoje. O método parece orquestrado e qualquer jornalista pode se tornar vítima de ataques na internet da noite para o dia. Nem mesmo aqueles que assumidamente apoiaram a candidatura de Bolsonaro são poupados dos ataques orquestrados. A atuação destes grupos se assemelha à uma máquina de destruição de reputações eficaz, que consegue até mesmo inibir o trabalho de alguns profissionais que ensaiam tecer críticas pontuais contra o governo, seus integrantes, o presidente e seus filhos. Muitos recuam com receio de ataques e perseguição pessoal por parte da milícia virtual. Outros, procuram ser mais 'comedidos' nas críticas.

O escândalo envolvendo o ex-assessor do senador Flavio Bolsonaro, Fabrício Queiroz, pode ser um bom exemplo. Apesar da ausência absoluta de explicações plausíveis, das reiteradas faltas a depoimentos, o silêncio dos membros da família Bolsoanro sobre o caso e o sumiço do ex-PM, setores da imprensa simplesmente abandonaram o assunto. Esta foi uma das pautas mais delicadas para a imprensa nos últimos meses. Bastava inserir o nome 'Queiroz' em qualquer manchete, e logo surgiam os comentários raivosos, indagando sobre os filhos de Lula, afirmando que o Coaf é aparelhado pelo PT e outros comentários impublicáveis.

Mas ao que tudo indica, a polêmica que causou a exoneração do ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, pode ter representado um fator determinante para o fim do receio de certos jornalistas e meios de comunicação quanto ao patrulhamento da imprensa por grupos de militantes políticos que atuam nos moldes de milícias, intimidando e fazendo campanhas pelo cancelamento de assinaturas de serviços de comunicação, como jornais e emissoras. 

Obviamente, muitos eleitores que votaram em Bolsonaro e em seus filhos não se sentem confortáveis quando são confundidos com milicianos virtuais, mas o fato é que esta cultura de perseguição e intimidação da imprensa surgiu ainda nos tempos de campanha, quando o próprio presidente se apropriou de técnicas de políticos como Lula, no sentido de desacreditar a imprensa. A boa relação dos governos e de seus líderes com os meios de comunicação, de forma republicana, democrática e transparente, é fundamental para o êxito de qualquer governo.

Estas tensões que tiveram início durante a campanha eleitoral parecem ter se agravado desde o surgimento de matérias na imprensa sobre o escândalo envolvendo o filho do presidente, senador Flávio Bolsonaro, e seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Na sequência, o escândalo envolvendo o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG) sobre o suposto uso de laranjas para desvio de desvio de dinheiro público do fundo eleitoral. O caso Bebianno, que também possui relação com o suposto uso de candidaturas de laranjas em Pernambuco, foi mais um episódio que fez com que as milícias virtuais atuassem de forma ainda mais agressiva contra jornalistas e meios de comunicação.

Todos estes desgastes não contribuem em nada para o bom andamento do governo e a aprovação de medidas importantes, como a Reforma da Previdência. Mas parece que as milícias virtuais não se importam com o país nem com os demais eleitores de Bolsonaro, que nele depositaram suas esperanças de um país melhor. A guerra suja que travam para impor narrativas, intimidando jornalistas e até mesmo outros cidadãos de manifestarem suas opiniões não combina com o ambiente democrático, nem com a liberdade de imprensa. Em um ambiente onde há liberdade de expressão, o cidadão tem o direito sagrado de ser informado, de não concordar, concordar ou de se surpreender com a informação. Os meios de comunicação parecem cada vez mais dispostos a enfrentar as milícias virtuais e esta tendência não é nada boa para um governo que se inicia de forma tão traumática. 



(Imprensa Viva)

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