LAVA JATO

Celso de Mello - Nelson Jr/STF
Brasília - O decano do Supremo Tribunal Federal
(STF), ministro Celso de Mello, decidiu na noite desta segunda-feira,
suspender dois processos do Conselho Nacional do Ministério Público que
podem tirar o procurador Deltan Dallagnol
da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Os casos estavam previstos
para serem julgadas na manhã desta terça-feira (18), e miram a conduta
de Dallagnol em relação à publicação nas redes sociais e supostas
atitudes de promoção pessoal.
"Sabemos que regimes autocráticos, governantes ímprobos, cidadãos corruptos e autoridades impregnadas de irresistível vocação tendente à própria desconstrução da ordem democrática temem um Ministério Público independente, pois o Ministério Público, longe de curvar-se aos desígnios dos detentores do poder - tanto do poder político quanto do poder econômico ou do poder corporativo ou, ainda, do poder religioso -, tem a percepção superior de que somente a preservação da ordem democrática e o respeito efetivo às leis desta República laica revelam-se dignos de sua proteção institucional", escreveu Celso de Mello.
"A remoção do membro do Ministério Público de suas
atribuições, ainda que fundamentada em suposto motivo de relevante
interesse público, deve estar amparada em elementos probatórios
substanciais, produzidos sob o crivo do devido processo legal,
garantido-se o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, sob
pena de violação aos postulados constitucionais do Promotor Natural e da
independência funcional do membro do Ministério Público", frisou o
decano.
Celso de Mello apontou que fatos sob investigação do
Conselho Nacional do MP já foram devidamente avaliados e arquivados, o
"que põe em perspectiva o dogma de que ninguém, em um Estado democrático
de Direito, pode expor-se a situação de duplo risco"
Os dois processos disciplinares em questão foram
apresentados pelos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Katia Abreu
(PP-TO). Enquanto Calheiros acusa Deltan de tentar influenciar as
eleições para a presidência do Senado no ano passado ao publicar tuítes
críticos ao emedebistas, Katia Abreu questionou o acordo firmado pela
Lava Jato Paraná com a Petrobrás para destinar R$ 2,5 bilhões
recuperados pela operação e que seriam geridos por uma fundação dos
procuradores.
Ao recorrer ao Supremo, Deltan alega que não tem
outra alternativa e pede que a Corte trave o julgamento dos casos e, no
mérito, seja determinado o seu trancamento, diante dos diversos vícios
que os contaminam. O chefe da Lava Jato Paraná afirma que suas
declarações sobre as eleições do Senado, em 2019, "apenas relatou um
fato objetivo" e "agrega uma análise de cenário sobre o futuro das
reformas anticorrupção". À época, Deltan afirmou que, caso Renan
Calheiros fosse eleito para comandar a Casa, "dificilmente veremos uma
reforma contra a corrupção aprovada". O procurador ainda destacou que o
emedebista tinha "várias investigações por corrupção e lavagem de
dinheiro".
"Não há pessoas nem sociedades livres sem liberdade
de expressão, de comunicação e de informação, mostrando-se inaceitável
qualquer deliberação estatal, cuja execução importe em controle do
pensamento crítico, com o consequente comprometimento da ordem
democrática", ressaltou Celso de Mello.
Para Celso de Mello, "qualquer medida que implique a
inaceitável proibição ao regular exercício do direito à liberdade de
expressão" dos membros do Ministério Público "revela-se em colidência
com a atuação independente e autônoma garantida ao Ministério Público
pela Constituição de 1988".
"Ficha limpa"
Mais cedo, o vice-presidente do STF, Luiz Fux,
decidiu que uma advertência aplicada contra Deltan não deve ser
considerada no julgamento de outros três processos previstos na pauta do
CNMP desta terça-feira que miram o procurador. A liminar de Fux garante
os "bons antecedentes" do procurador e, assim, pode favorecer a defesa
do procurador em um julgamento de grande importância marcado para esta
terça-feira no CNMP.
A decisão foi vista nos bastidores do CNMP como um
prenúncio de uma nova gestão no Supremo, que poderá alterar uma
correlação de forças que caminhavam para uma correção dos excessos da
Lava Jato. Simpático à força-tarefa de combate à corrupção, Fux assumirá
a presidência do STF no dia 10 de setembro, no lugar do ministro Dias
Toffoli, integrante da ala que, desde 2017, vem impondo reveses aos
procuradores de Curitiba.
Segundo um conselheiro, que não quis se identificar, a
decisão de Fux deve afetar o julgamento de Deltan Dallagnol, já que o
antecedente da advertência poderia viabilizar uma medida mais grave
desta vez. Na prática, ao manter Deltan "ficha limpa", Fux retirou um
dos argumentos que poderiam basear a abertura de um processo para a
remoção de Dallagnol do comando da Lava Jato.
A punição aplicada pelo CNMP a Deltan Dallagnol foi
uma advertência, em novembro do ano passado, por 8 votos a 3. O
julgamento marcou a primeira vez que Deltan foi punido pelo Conselho
Nacional do MP, órgão responsável por fiscalizar a conduta de membros do
MP. Esse processo dizia respeito à entrevista à rádio CBN na qual
Deltan criticou o STF, ao afirmar que três ministros do Supremo formam
"uma panelinha" e passam para a sociedade uma mensagem de "leniência com
a corrupção".
(Por:Estadão Conteúdo)
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