Dia 1º de maio de 1994 caiu num domingo. Foi nessa data que a F1 organizou o GP de San Marino, em Ímola, na Itália, terceira etapa do campeonato. Desde então, portanto há 22 anos, nunca mais uma corrida de F1 coincidiu de ser disputada dia 1º de maio. Para o fã da F1, ou mesmo aqueles que se sensibilizam com uma mensagem mais elevada, o 1º de maio representa sempre um momento para reflexão, por vezes confundido com saudade. Foi nesse dia que Ayrton Senna sofreu o acidente fatal na curva Tamburello, na segunda volta da relargada, depois da saída do safety car, na sexta volta da prova, às 14h17.
Ayrton Senna: acidente fatal foi há 22 anos (Foto: Divulgação)
“Era novembro ou dezembro, não me lembro. Só sei que tocou o telefone às duas horas da manhã, na minha casa. Eu acordei assustado e perguntei quem era. Ayrton respondeu, rindo. Recordo de ter dito a ele que aquela não era hora para brincadeira. Foi quando ele me disse que estava ligando para me dizer que desejava seguir comigo, ele se encarregaria da minha transferência para a Williams”, disse ao GloboEsporte.com, Leberer.
Josef Leberer posa ao lado da McLaren MP4-4 de Ayrton Senna (Foto: Alexandre Schneider)
Para o fisioterapeuta, o fato de 22 anos depois o tema Ayrton Senna reverberar com intensidade no paddock “é uma demonstração da sua força, do quanto deixou não só para a F1, mas todos nós. Eu me sinto orgulhoso”.
Felipe Nasr e Josef Leberer, com o capacete de assinatura de Senna (Foto: Amir Nasr)
Felipe Massa teve um momento de desgaste com Senna, quando ainda era bem jovem. Como todo piloto de kart, Massa via Senna como um modelo. Até hoje a lenda Ayrton Senna circula com desenvoltura no kartódromo de Interlagos, onde ele tanto competia e treinava. “Eu estava em Ilha Bela (litoral paulista), num clube, e o Senna chegou com uma moça, num barco. Ancorou lá. Eu fui pedir um autógrafo e ele não me deu a atenção que eu esperava. Para uma criança isso marca”, contou Massa ao GloboEsporte.com.
Felipe Massa lembra que teve a infância marcada por não ganhar autógrafo de Senna (Foto: Reprodução / TV TEM)
O fato de a corrida de Sochi também ser realizada dia 1º de maio não tem significado maior. “Não é por isso que nos lembraremos mais ou menos de Senna. Sempre dia 1º de maio em alguma hora você vai pensar nele.”
O suíço Beat Zehnder era o chefe dos mecânicos da Sauber em 1994. Além de Senna o GP de San Marino teve outra fatalidade. No sábado, o austríaco Roland Ratzemberger, da Simtek, perdeu a vida na sessão de classificação, ao colidir no muro da curva Villeneuve.
Como Leberer, o chefe da Sauber não se ateve a coincidência de datas entre o GP de San Marino de 1994 e o da Rússia, neste domingo. “Não pensei nisso, 1º de maio será sempre 1º de maio para nós. Não temos como esquecer. Primeiro o acidente do Rubens (Barrichello), na sexta-feira, depois a morte do Roland, no sábado, que havia pilotado para nós, quando competíamos no Esporte Protótipos, e no domingo o que aconteceu com Senna.”
Zehnder faz uma declaração surpreendente: “No domingo, eu disse a Peter Sauber que estava deixando a equipe. Eu não queria aquilo para mim, foi muita coisa junta, em tão pouco tempo. Peter Sauber conversou comigo nos dias seguintes e fui aceitando a ideia de rever minha decisão”.
O problema para o suíço é que na corrida seguinte, Mônaco, no primeiro treino livre, quinta-feira de manhã, o piloto da Sauber Karl Wendlinger bateu na saída do túnel e entrou em coma. “Foi outro impacto enorme.” Ele sobreviveu, mas os danos afetaram sua capacidade de pilotar. A carreira na F1 praticamente acabou ali. “Depois de tudo o que passamos duas semanas antes, lá em Mônaco vieram nos informar que Karl estava tendo convulsões.”
Max Mosley, presidente da FIA, liderou a proibição, a partir de 1994, da grande maioria dos recursos eletrônicos dos carros, como suspensão ativa, controle de tração, freios ABS, acelerador eletrônico, dentre outros. “Mas não reduziu a potência”, disse ao hoje repórter do GloboEsporte.com o grande nome de engenharia nos anos 80 e início dos 90, John Barnard, ex-McLaren, Ferrari e Benetton.
Ayrton Senna com a bandeira brasileira. Ele é lembrado 22 anos depois (Foto: Edu Garcia / Agência Estado)
O austríaco Roland Ratzenberger também morreu em acidente em Ímola (Foto: Reprodução / Twitter)
Tudo o que se passou naqueles dias serviu, na visão de Niki Lauda, para salvar muitas vidas. “É triste, perdemos pilotos, amigos, mas aquelas tragédias serviram para dar novo rumo à segurança da F1. Veja os carros hoje e os daquele tempo. Só de olhar dá para ver que a segurança avançou muito. Um acidente como o de Fernando (Alonso) na Austrália não permitiria ao piloto sobreviver. E o vimos sair debaixo do carro tirando a poeira do macacão”, falou ao GloboEsporte.com.
“A data de 1º de maio e a de 30 de abril, quando perdi um amigo, Roland, são para serem lembradas independente de nesses dias haver corrida de F1 ou não”, diz o austríaco. Curiosamente, naquele 1º de maio de 1994, Lauda chamou Senna para uma reunião. O hoje repórter do GloboEsporte.com viu o exato momento em que Lauda, domingo de manhã, depois do warm up, treino que havia 4 horas e meia antes das largadas, disse a Senna, no paddock: “Você tem de liderar esse movimento”.
O campeão do mundo de 1975 e 1997, pela Ferrari, e 1984, McLaren, sabia que havia algo errado com a F1, o regulamento tornou os carros inseguros, o corte repentino de todos os recursos eletrônicos elevou sobremaneira a possibilidade de os pilotos perderem o controle do carro. “Sim, eu me reuniria com Ayrton naquela semana”, falou Lauda, consultor da Ferrari. O encontro seria na quinta-feira. A ideia era questionar Mosley sobre as mudanças e propor algo para reduzir os riscos de novos acidentes.
Não foi possível. Horas depois, naquele 1º de maio de 1994, Senna foi outra vítima daquela F1 desarmônica, insegura, perigosa, cujos responsáveis pelo regulamento não levaram em conta questões elementares, como a possibilidade altíssima de o carro fugir ao controle dos pilotos.
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