A votação que garantiu a posse do peemedebista provocou uma crise na base de Temer. Isso porque um ‘acordão’ entre PT e PMDB resultou no fatiamento do julgamento de Dilma, que livrou a petista da inabilitação política por oito anos – irritando DEM e PSDB. Nos bastidores, a articulação de aliados da petista para conseguir dividir o julgamento em duas etapas foi atribuída a um acordo com presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Renan sempre se disse desconfortável com o impeachment, mas declarou na sessão desta quarta, sentado à Mesa Diretora, ser contra a suspensão dos direitos políticos da petista. Na reunião com ministros, Temer disse que parte de sua base causou embaraço ao governo ao votar pela manutenção dos direitos políticos da presidente cassada sem consultar o governo previamente e disse que não tolerará este tipo de conduta.
O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), culpou o PMDB pelo desfecho do julgamento e se disse surpreendido em cima da hora. Ele colocou em dúvida o compromisso real de lideranças peemedebistas com o governo Temer e as reformas propostas econômicas e acordadas com o partido. Parcela do PSDB passou a defender ao fim da votação um rompimento com Temer. Eles reclamaram de não terem sido avisados da posição dividida do PMDB. “O PMDB começou a tratar o PSDB da maneira que era tratado pelo PT”, queixou-se o líder do PSDB, senador Cássio Cunha Lima (PB).
Não se trata da primeira crise com tucanos. A legenda já pressionou publicamente Temer para que deixe de fazer concessões no controle dos gastos públicos após a votação final do impeachment. E o partido desconfia também das reais intenções do peemedebista em 2018. Não à toda, o presidente repetiu diversas vezes que tem pela frente apenas dois anos e quatro meses de mandato. Temer disse esperar que sua equipe de governo consiga colocar o Brasil nos trilhos, para conseguir chegar ao fim do seu mandato, em 31 de dezembro de 2018, “com o aplauso do povo brasileiro”.
Divergências na base são um especial motivo de preocupação para Temer. Isso porque o impeachment de Dilma Rousseff já era fato consumado havia meses – ao menos para os agentes do mercado financeiro. Não por acaso, desde 12 de maio, quando a então presidente foi afastada do cargo, a Bovespa acumula alta de quase 10%; no ano, o avanço chega a 33,5%. Assim, a mudança no governo já está, como dizem operadores e investidores, “precificada” – ou, em outras palavras, o que tinha de influenciar o mercado, ela já influenciou.
Agora, as atenções do mercado financeiro se voltam para as ações do governo – não mais interino – de Michel Temer. E o escrutínio será particularmente meticuloso sobre seus sucessos e insucessos nas negociações das reformas com o Congresso. Até aqui, o governo Temer estava sob a sombra da interinidade, o que, por mais improvável que fosse o retorno de Dilma ao poder, ainda travava as negociações, raciocina o economista Otto Nogami, professor do MBA do Insper. “Agora essa desculpa não existe mais”, diz.
Os temas econômicos ganharam especial atenção no pronunciamento de Temer à sua equipe. “Gerar emprego é o primeiro tema que deve ser levado em conta nas nossas decisões. Se há hoje um certo amargor das pessoas nas ruas, é em função do desemprego. Quando começarmos a gerar empregos, isso vai tirando esse amargor”, afirmou. “Não será fácil. Temos uma margem enorme de desempregados, de quase 12 milhões de pessoas, uma cifra assustadora. Não há coisa mais indigna que o desemprego, que fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana”, completou.
Ele pediu aos ministros que trabalhem em busca de apoio no Congresso para aprovar as medidas necessárias, inclusive o que chamou de ‘adequação da relação trabalhador-empregado’. “Vamos às bancadas. É preciso também dar publicidade à necessidade de reforma da Previdência. Não queremos fazer uma coisa de cima para baixo. Precisamos da compreensão da sociedade brasileira”.
A reforma da Previdência é crucial para o futuro das finanças do país, mas seu impacto deve ser mais forte no longo prazo, afirma o professor. Para o curto prazo, diz, é essencial que o governo tenha sucesso em duas frentes: a Proposta de Emenda Constitucional que impõe teto aos gastos públicos e o adiamento dos reajustes ao funcionalismo público. São temas-chave para começar a tirar as contas públicas – e a economia do país – do atoleiro. E como definiu Temer: “A cobrança será muito maior sobre o governo”.
Por Patrick Cruz e Carolina Farina/Veja
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