quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Conselho aprova demolição do Reis Magos, mas derrubada segue indefinida. Há quatro processos de tombamento do Reis Magos, todos de iniciativa do Instituto dos Amigos do Patrimônio Histórico e Artístico Cultural e da Cidadania (Iaphacc)

POLÊMICA
 
 Conselho Municipal votou pela derrubada da estrutura

O Conselho Municipal de Cultura (CMC) aprovou a demolição do prédio que abrigou o Hotel Reis Magos. Por unanimidade, o órgão, que é formado por representantes de diversas instâncias da Prefeitura do Natal, concluiu que o eventual tombamento da estrutura demandaria “altos custos de manutenção” e que o prédio não tem valores artísticos, históricos, arquitetônicos ou culturais que justifiquem a sua preservação.
A reunião do CMC aconteceu no dia 7 de agosto, mas a decisão só se tornou pública na última terça-feira, 20, quando a ata do encontro foi publicada no Diário Oficial do Município. A portaria com o teor das discussões é assinada pelo presidente do colegiado, o secretário municipal de Cultura, Dácio Galvão, e demais membros.
Como o conselho é de caráter deliberativo e técnicos da Fundação Capitania das Artes (Funcarte) não pretendem recorrer, o processo que pede o tombamento deverá ser declarado encerrado no âmbito da Prefeitura do Natal. Isso não significa, contudo, que a demolição está autorizada. A derrubada do prédio depende da conclusão de outros três processos que tratam do assunto.
Todos os processos de tombamento do Reis Magos são de iniciativa do Instituto dos Amigos do Patrimônio Histórico e Artístico Cultural e da Cidadania (Iaphacc). Além do que é analisado no âmbito municipal, há outros dois na esfera administrativa – um no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e um no Governo do Estado – e outro no campo judicial. Enquanto esses processos não são finalizados, há um tombamento provisório em vigor – decretado em 2014 pela Fundação José Augusto.
Em fevereiro de 2017, o Iphan decidiu pelo não tombamento do hotel. Em maio deste ano, o processo foi reaberto a pedido do Iaphacc, que solicitou a apresentação de novos relatórios e laudos. Em nota, o Iphan explicou que a reabertura é meramente formal e que isso não significa revisão da “análise técnica”.
Na primeira decisão, o Iphan concluiu que o prédio não tem valores nacionais, e sim locais. Por isso, segundo o órgão, não caberia proteção nacional. “Apesar da contextualização do bem no cenário mais amplo do modernismo brasileiro, sua importância está mais relacionada a questões econômicas e da urbanização local”, ressaltou o órgão federal. É esse entendimento que o Iaphacc contesta.
No início deste ano, após analisar os autos do processo que corre na Fundação José Augusto (órgão do Governo do Estado), a procuradora do Estado Marjorie Madruga emitiu parecer pela preservação da fachada e da volumetria do imóvel, além de um corredor, por, segundo ela, representarem aspectos da arquitetura modernista brasileira.
O parecer de Marjorie Madruga foi discutido pelo Conselho Estadual de Cultura no mês passado. Por nove votos a um, o colegiado – que é de caráter consultivo, não deliberativo – opinou pelo não tombamento do prédio. A decisão final cabe ao secretário estadual de Educação, Cultura, Esporte e Lazer, Getúlio Marques Ferreira, que analisa o processo atualmente, sem prazo para se pronunciar.
Na esfera judicial, o processo de tombamento do Reis Magos tramita na Justiça Federal. A mais recente decisão envolvendo o hotel foi proferida pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, de Recife (PE), em julgamento de recurso. Na ocasião, os desembargadores entenderam que não cabia tombamento pela via judicial. Na mesma decisão, o TRF-5 advertiu que isso não significa autorização para a demolição do imóvel, tendo em vista que outros processos correm na esfera administrativa.

 
 Proprietários querem demolição para fazer investimento
O Grupo Hotéis Pernambuco, proprietário do imóvel, voltou a defender a demolição da estrutura nesta quarta-feira, 20. Em visita a Natal, onde participa nesta quinta-feira, 21, de uma reunião do Conselho Municipal de Turismo, o advogado João Vicente Gouveia registrou que há laudos técnicos que apontam que o custo para a recuperação do hotel seria muito superior ao custo da demolição e reconstrução da estrutura.
“O prédio está em um estado de conservação tal que não há mais o que tombar. É inviável economicamente. O estado está tão ruim que a obra de engenharia seria dez vezes mais cara do que fazer um novo. Foram feitas escavações nos alicerces que apontaram que não se justifica o tombamento”, disse o advogado, à reportagem do Agora RN, antes de uma reunião com o secretário municipal de Turismo, Fernando Fernandes, e assessores jurídicos da Funcarte.
Segundo João Vicente, o grupo tem interesse de investir na região, desde que a demolição seja autorizada definitivamente. O advogado conta que diversos projetos já foram elaborados para o lugar, inclusive o de um novo hotel, mas que os estudos esbarram na indefinição quanto à possibilidade de uso do terreno, de cerca de 1 hectare. “Temos interesse não só de tirar proveito do potencial turístico da cidade, mas também de contribuir com o desenvolvimento turístico local”, assinalou.
O advogado argumenta que o eventual tombamento da estrutura não teria efeito prático. Ele conta que, por causa do alto custo, a empresa não teria interesse de fazer o investimento na preservação. E, como o Governo do Estado e a Prefeitura do Natal enfrentam dificuldades financeiras, provavelmente também não aplicariam recursos para restaurar o hotel. “Ficaria mais 25, 30 anos daquela forma e ‘tombaria’ por si próprio”, complementa.
João Vicente Gouveia diz esperar uma resolução rápida para o imbróglio. Ele questiona, inclusive, o tempo do processo administrativo – seis anos. Segundo ele, há uma decisão do TRF-5 que estabelece um ano para a conclusão da análise sobre o tombamento. “Isso foi há três anos, superando muito a duração razoável do processo”, conclui.
Inaugurado em 1965 por iniciativa do então governador Aluízio Alves, o Hotel Internacional dos Reis Magos foi o primeiro empreendimento turístico de alto padrão do Rio Grande do Norte. O prédio, localizado na Praia do Meio, na zona Leste de Natal, está abandonado desde 1995. O Grupo Hotéis Pernambuco comprou a estrutura após o encerramento das atividades e chegou a anunciar investimento, em 2014, de aproximadamente R$ 130 milhões (valores da época), mas o projeto não progrediu em função da disputa judicial e administrativa em torno do tombamento.
Atuação de procuradora do Estado é criticada por empresários
A polêmica em torno do Hotel Reis Magos foi reacendida no início deste mês, quando, em entrevista a uma emissora de rádio local, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-RN), José Odécio Júnior, criticou Marjorie Madruga pelo fato de a procuradora do Estado defender o tombamento parcial do Hotel Reis Magos. Segundo o hoteleiro, Marjorie usa o cargo para “prejudicar” o desenvolvimento do Rio Grande do Norte.
“Tem que dar um basta no que essa senhora está fazendo, não só no caso daquele entulho que ela insiste em manter de pé”, desabafou Odécio.
Em nota, a Procuradoria-Geral do Estado repudiou veementemente o que classificou como “ataques infundados” contra a procuradora. A PGE afirma que a atuação do órgão no processo de tombamento do Reis Magos é “fundamentada em diversos estudos, pareceres e laudos técnicos e na legislação brasileira”.
Após isso, entidades ligadas ao setor privado endossaram as críticas de José Odécio Júnior e defenderam a demolição da estrutura. Em nota conjunta, as instituições afirmam que o presidente da ABIH-RN “apenas constatou fatos públicos e notários da atuação funcional de uma determinada procuradora estadual, que está sempre em desfavor do desenvolvimento econômico e sustentável do Estado, cuja crítica a sua atuação profissional não pode, nem deve se confundir com ataque pessoal”.
O texto foi assinado por representantes da Associação Brasileira de Agências de Viagens do Rio Grande do Norte (Abav-RN), Associação Norte-rio-grandense de Criadores de Camarão (ANCC), Natal Convention Bureau,  Câmara de Dirigentes Lojistas de Natal (CDL), Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Norte (FCDL-RN), Associação de Hoteleiros de Tibau do Sul e Pipa (Ashtep), Sindicato das Empresas de Turismo do Rio Grande do Norte (Sindetur) e Sindicato de Hotéis Restaurantes Bares e Similares do Rio Grande do Norte (SHRBS-RN).
Também em nota, o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) disse estar preocupado com o “elevado nível de tensão e perda de foco” com que o assunto vem sendo discutido.
“Com tantos e tão graves problemas que a cidade precisa debater e decidir com urgência, como a revisão do atual Plano Diretor, não faz sentido perder tempo e energia com um assunto que já foi deliberado em várias instâncias governamentais e judiciais”, destacou.
O Sinduscon defende que o destino do Reis Magos, por ser propriedade privada, deve ser definido pelo seu dono, o Grupo Hotéis Pernambuco. “Qualquer outra rota somente reforçará a ideia, já estabelecida, de que no Rio Grande do Norte o empreendedor é tratado por alguns com desconfiança e hostilidade, como se fosse um problema e não a solução para o desenvolvimento sustentável”.

(Por:AgoraRN)

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