É possível recuperar as lesões cardíacas da doença de Chagas, mostram estudos.Pesquisadores brasileiros buscam novas terapias para a doença de Chagas; remédios usados atualmente controlar os sintomas, mas não impedem o avanço das lesões causadas pela infecção
DOENÇA DE CHAGAS
Ao menos
três novos estudos brasileiros mostram avanços consideráveis no
tratamento da doença de Chagas. A doença atinge atualmente cerca de 4
milhões de pessoas no Brasil.
Thinkstock
Doença de Chagas atinge cerca de 4 milhões de pessoas
O mais
recente deles mostra que é possível recuperar lesões cardíacas de
pacientes com a doença. Atualmente, o tratamento de pacientes na fase
crônica, quando a infecção já se aloja nos músculos do coração e do
aparelho digestivo, é feito em cima dos sintomas e não na causa da
infecção. Porém, testes feitos em camundongos por uma equipe da
Fiocruz, liderada pela pesquisadora Joseli Lannes Vieira, bloquearam a
toxina que desencadeia os problemas cardíacos.
“Provamos
que nossa hipótese estava correta, que existe relação direta entre a
inflamação e a cardiopatia. O bloqueio da citocina com o uso de uma
droga levou a uma melhora do quadro. Agora precisamos fazer novos testes
usando outras formas de terapias que também reduzam o TNF [uma
substância inflamatória] e não tenham tantos efeitos colaterais. Uma
possibilidade é o omega 3, que é mais barato”, diz.
Doença negligenciada:Um bilhão de pessoas sofrem de doenças tropicais esquecidas A
equipe tinha observado que pacientes com cardiopatia por doenças de
Chagas grave, além do aumento do tamanho do coração, apresentavam altos
níveis de TNF solúvel no sangue. O coração aumenta de tamanho e tem
batimento irregular, entre outros problemas.
Agora é preciso que
se façam mais testes com outras terapias que reduzam do TNF no sangue e
também fazer testes em humanos. “É um processo e demos o primeiro passo.
Durante cem anos não se teve uma proposta terapêutica para a doença de
Chagas. Mitigam-se os sintomas nos pacientes, a doença evolui de uma
forma mais lenta, mas o paciente continua apresentando os mesmos
problemas”, afirma. Joseli explica que a maioria dos pacientes
com doença de Chagas no Brasil já está na fase crônica da doença, quando
a infecção já se aloja nos músculos do coração e do aparelho digestivo.
Na fase crônica, não há ainda comprovação da eficácia dos medicamentos
disponíveis. Os remédios usados atualmente podem apenas controlar os
sintomas e melhorar a qualidade de vida dos pacientes, mas não impedem o
avanço das lesões causadas pela infecção.
Depressão de Chagas
Outra descoberta importante, realizada em 2012, foi a comprovação de
que a depressão faz parte da doença. “Conseguimos mostrar em modelo
animal que a depressão faz parte da doença. Provamos que camundongos com
doença de Chagas apresentavam sintomas da depressão”, diz. Depressão atinge 10% da população, mas saúde pública não consegue diagnosticar Para
Joseli, o importante dessa descoberta também está no fato de comprovar
que pacientes com Chagas devem sem tratados também por psicólogos e
psiquiatras. “Acreditava-se que o paciente ficava deprimido
por causa do estigma da doença, mas sabemos que o camundongo não vai
ficar deprimido por conta disso. Logo, provamos que é algo biológico.
Existe uma relação entre a infecção e a depressão”, afirma a
pesquisadora que também participou deste estudo.
MetasOs
estudos fazem parte de um esforço para desenvolver droga e novas
propostas terapêuticas contra a doença de chagas. A meta é que até 2019
– ano que a descoberta da doença faz 110 anos –, os pacientes tenham a
cura.
Joseli afirma que há muito o que comemorar e também muito a
ser descoberto, inclusive está em estudo a criação de uma vacina contra a
doença. “Essa é uma doença negligenciada, uma doença da pobreza. Até
2005, o que se dizia é que se tratava de uma doença sem cura.
Inicialmente, o que se fazia era combater o vetor, o barbeiro, mas pouco
ainda havia sido estudado sobre como a doença age na pessoa infectada”,
disse.
A doença de Chagas é causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi
e transmitida ao homem pela picada de um inseto conhecido como
“barbeiro”, “potó”, “procotó” ou “chupão”. Após sugar o sangue da
pessoa, o inseto libera fezes infectadas com o parasita. Pelo contato
das mãos com as fezes do barbeiro ao coçar o local da picada ou levar a
mão à boca ou aos olhos, o parasita penetra na corrente sanguínea. Há
ainda outras formas de transmissão: da mãe infectada para o bebê ainda
na barriga, por transfusão de sangue e contaminação por alimentos que
contenham fezes do inseto.
No prazo do relógioEm
2006, o Brasil recebeu um certificado da Organização Mundial da Saúde
(OMS) e da Organização Panamericana de Saúde (Opas) por ter conseguido
interromper a transmissão da doença de Chagas pela espécie de barbeiro
mais frequente no país: o Triatoma infestans.
No
entanto, segundo o Ministério da Saúde, nos últimos anos, estão surgindo
novos casos da infecção devido a uma forma alternativa de transmissão
ligada à contaminação de alimentos. Principalmente na região amazônica,
surtos de casos agudos vêm sendo registrados entre pessoas que
consumiram suco de açaí e caldo de cana. As bebidas são contaminadas
pelo T. cruzi quando barbeiros infectados são moídos acidentalmente
junto com os alimentos.
Faltam ainda pouco mais de quatro anos
para que os pesquisadores atinjam a meta de encontrar uma cura para a
doença. “Ainda existe muita gente com a doença e muita gente em cidades
grandes como o Rio e São Paulo, por exemplo. Na América Latina, nem se
fala. Em Cochabamba, na Bolívia, 70% da população tem a doença. Por
isso, pesquisar a doença de Chagas cabe a nós mesmos. Acredito que
teremos muita coisa boa descoberta nos próximos anos”, afirma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário