domingo, 27 de outubro de 2019

'Segunda instância' opõe visões sobre a Constituição

STF
 Rosa Weber oficializou o trânsito em julgado do processo
 Rosa Weber apresentou o voto que deve definir o rumo do julgamento no Supremo

São Paulo (AE) - A possibilidade de revisão do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre prisões após condenações em segunda instância, aberta na quinta-feira, 24, a partir do voto da ministra Rosa Weber, reascendeu a discussão entre os que defendem os preceitos da Constituição e aqueles que consideram interpretá-lo em nome do combate à criminalidade. Interrompido com placar de 4 a 3 a favor da condenação em segunda instância, o julgamento está previsto para ser retomado em novembro.

Relator do julgamento que garantiu o direito de recorrer de uma condenação em liberdade até a última instância, em 2009, o ex-ministro do STF Eros Grau diz que não há margem para interpretação. Para ele, o artigo 5.º da Constituição é claro em estabelecer que a prisão deve ocorrer após o trânsito em julgado

Já o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, considera que o texto constitucional não é absoluto e que prisão após condenação em segunda instância é "salutar". Segundo ele, a Constituição diz que ninguém pode ser considerado culpado até o fim do processo penal, mas não diz claramente que o réu não pode ser preso.


'Não existe interpretação intermediária'
Para o jurista Eros Grau, ex-ministro do Supremo, abrir a possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância é descumprir o art. 5º da Constituição, que prevê que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

"Fui relator do processo no julgamento que decidiu que a Constituição deve ser lida, e zelar o que está escrito no artigo 5.º. Está lá no inciso LVII que a prisão é só quando o processo estiver transitado em julgado."

"A Constituição tem de ser cumprida. E nesse caso, o preceito é muito claro. Não tem como ser interpretado de modo diverso", avaliou. Segundo o ministro, o entendimento de que é possível prender um réu condenado em segunda instância foi firmado em 2o16 porque os ministros "não estão cumprindo o dever de respeito à Constituição, que é o dever do magistrado." "(A interpretação do art. 5.º da Constituição) é uma coisa mais do que clara, nítida, cristalina, como a luz solar."

"Para mim, não existe nenhuma possibilidade de se inventar qualquer argumento quando a Constituição é clara e não deixa dúvidas. Quando há um preceito numa lei que pode ser interpretado de modo distinto, tudo bem. Aí vamos discutir essas interpretações. Mas quando é claro, como é claro o Artigo 5.º da Constituição, não cabe outra interpretação. Não há interpretação intermediária."

O ex-ministro do Supremo se diz cético em relação à tese de uma "interpretação intermediária", proposta pelo presidente do Supremo, Dias Toffoli. Segundo a tese, seria estabelecida a possibilidade de prisão após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), apelidada de "terceira instância". Até agora, no entanto, essa possibilidade não foi discutida no julgamento, mas pode entrar em pauta em novembro. "Por que não a 15ª (instância)? Ou a 39ª? Não serve", questionou.


'Princípio da Constituição não é absoluto'
O procurador da República e coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, afirmou nesta sexta durante palestra que "nenhum princípio da Constituição é absoluto".

A declaração foi feita em um comentário introdutório da palestra que realiza no 7.º Congresso de Direito Constitucional promovido pela Faculdade de Tecnologia Jardim (Fatej) e pela Faculdade de Direito Santo André (Fadisa) no Teatro Municipal de Santo André, na região do ABC paulista.

Segundo o procurador, a prisão após condenação em segunda instância é algo "salutar". O coordenador da Lava Jato alegou que a Constituição estabelece que ninguém será "considerado culpado" até o trânsito em julgado, mas "não fala que ninguém será preso" até que todos os recursos na Justiça sejam esgotados

"A presunção de inocência deve ser compatibilizada com outros direitos e valores constitucionais e com a eficiência da Justiça", completou.


Decano
Deltan disse ainda esperar que a aposentadoria compulsória do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, em 2020, permita que possível decisão contrária da Corte à prisão após condenação de réus em segunda instância seja "revertida" posteriormente pelo mesmo tribunal.

Sem citar o decano do Supremo nominalmente, Dallagnol falou na "mudança de ministro no ano que vem" - Celso de Mello é o único integrante da Corte que completa 75 anos em 2020, a idade para que haja a aposentadoria compulsória.

O decano do Supremo ainda não deu seu voto no julgamento das liminares de três Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) questionando as prisões após sentença em segundo grau, mas, em ocasiões anteriores, se posicionou contra a execução provisória da pena.


(Por:tn) 

Nenhum comentário:

Postar um comentário