sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Em decisão, juiz eleitoral do RN chama debate político na web de “suruba.” Magistrado criticou postura dos políticos e dos internautas ao julgar pedido da candidata do PT ao Governo do Estado, Fátima Bezerra, para excluir conteúdo considerado ofensivo do Facebook

INUSITADO
 
 Juiz federal Almiro da Rocha Lemos, do TRE-RN

O juiz federal Almiro da Rocha Lemos, do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte (TRE-RN), determinou que o Facebook exclua da página “Rn Urgente”, em até 48 horas, uma publicação que liga a candidata do PT ao Governo do Estado, Fátima Bezerra, a uma cena que – na opinião do magistrado – explora a imagem infantil. Segundo o Agora RN apurou, o conteúdo já foi retirado do ar.

A imagem mostrava um beijo entre duas crianças – algo que seria, segundo a publicação, endossado por Fátima Bezerra e o seu partido. Ao determinar a exclusão do post, o juiz apontou violação ao Estatuto da Criança e do Adolescente, que proíbe discriminação e outros tipos de violência contra jovens, e exacerbação do direito à liberdade de expressão.

“Se, por um lado, a liberdade de expressão pode justificar a difusão de ideias toscas, não permite, que, para tanto, se recorra à exploração da imagem infantil”, escreveu Almiro Lemos, acrescentando que “a manifestação de carinho entre duas crianças (…) não pode ser explorada para ilustrar preferências políticas”.

A defesa de Fátima Bezerra havia solicitado a remoção de outras três publicações, mas o juiz negou. Em sua decisão, Almiro Lemos argumentou que, embora sejam “repugnantes” e “reprováveis”, as peças não são fake news (notícias falsas), e a publicação desse tipo de conteúdo está protegida pelo preceito constitucional da liberdade de expressão.

Em uma das publicações, a página postou uma foto de Fátima Bezerra na qual a candidata segura um cartaz com a inscrição “Eu digo não à redução da idade penal”, acompanhada da seguinte mensagem: “O fim do RN está por chegar , fim da polícia militar , vagabundo não será mais preso!”. Na segunda, a página afirma que Fátima apoia a distribuição de “kit gay” nas escolas, algo que estaria em seu plano de governo (o que não é verdade). E outra publicação mostra que o traficante Fernandinho Beira-Mar seria candidato a deputado federal pelo PT, partido de Fátima.

O juiz decidiu que esses três conteúdos poderiam permanecer no ar, mas criticou o nível do debate político na internet e as posturas dos próprios candidatos. “Embora o reducionismo e a pobreza das idéias (sic) sejam evidentes, infelizmente não é incomum que mesmo aqueles que pretendem ocupar os mais relevantes cargos da república federativa argumentem de forma semelhante”, criticou o magistrado.

Almiro Lemos sugeriu que o baixo nível dos debates e argumentos entre internautas seria resultado do debate entre os próprios políticos. “Não é incomum que a dita ‘direita’ impinja tais acusações à dita esquerda, transformando a defesa de direitos humanos e direitos das minorias em um discurso inaceitável para a sociedade, como, ao revés, não são poucas as vezes em que a ‘esquerda’ de forma minimamente desapegada de conceitos de macroeconomia transforma os mais básicos conceitos de responsabilidade fiscal da ‘direita’ em algo deletério para o trabalhador”, pontuou.

No trecho mais inusitado da decisão, o magistrado classificou a discussão política como uma “suruba”. “Com o perdão da linguagem, mas pela força ilustrativa, cabe citar o que foi dito à imprensa por elevada autoridade da República: ‘suruba é suruba, aí é todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada’”, argumentou.

Em relação à publicação que aponta que Fernandinho Beira-Mar seria candidato a deputado federal pelo PT, o juiz decidiu que trata-se de uma sátira e aproveitou o fato para, de certa forma, alfinetar o partido de Fátima Bezerra. “É público e notório que o partido da representante tem como candidato um cidadão brasileiro recolhido à custódia por sentença judicial penal confirmada por órgão colegiado”, escreveu, se referindo ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cumpre pena em Curitiba por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, mas é candidato à Presidência este ano pelo PT. O caso de Lula deve ser julgado pela Justiça Eleitoral nesta sexta-feira, 31.

Ao longo da decisão – proferida na terça-feira, 28 -, o magistrado negou, também, os pedidos de Fátima para retirar a página do ar temporariamente e para obter dados sobre quem administra a página.

A candidata Fátima Bezerra não quis comentar a decisão.

Leia aqui a decisão.

(Agora)

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