
Um dia antes de ser preso, enquanto Lula negociava com a Polícia Federal, seus advogados entraram com recurso na ONU, segundo o jornal Estado de São Paulo - AFP PHOTO / Miguel SCHINCARIOL
Rio - O Comitê de Direitos Humanos da ONU rejeitou o
pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que seja solto no
Brasil, como parte de medidas cautelares solicitadas por seus
advogados. O caso nas Nações Unidas, porém, não está encerrado e uma
avaliação completa de sua situação, iniciada desde meados de 2016,
continua a ser realizada.
O governo brasileiro terá mais seis meses para
responder a uma série de perguntas formuladas pela ONU. Mas uma decisão,
segundo a entidade, ficará apenas para 2019.
"O Comitê de Direitos
Humanos não concederá medidas cautelares no caso de Lula da Silva",
declarou a porta-voz de Direitos Humanos da ONU, Julia Gronnevet.
Uma resposta positiva por parte da ONU significaria, na
avaliação da entidade, apertar o botão de "pausa" num processo em
andamento para que eventuais violações de direitos humanos fossem
avaliadas. Nesse caso, os riscos de um dano irreparável não foram
constatados.
O jornal O Estado de S. Paulo revelou com exclusividade
no mês passado que um recurso ao Comitê de Direitos Humanos da ONU era
uma possibilidade. Um dia antes de ser preso, enquanto Lula negociava
com a Polícia Federal, seus advogados entraram com a queixa na ONU. A
reportagem apurou que chamou a atenção do organismo a rapidez da decisão
do juiz federal Sérgio Moro.
Uma eventual decisão de recomendar medidas urgentes
ocorreria por conta da avaliação dos peritos da ONU de que a prisão lhe
impediria de exercer plenamente seus direitos políticos. Mas o apelo não
foi atendido.
Olivier de Frouville, um dos membros do Comite da ONU,
explicou que a avaliação concluiu que "não houve um dano irreparável"
com a prisão de Lula. "Tomamos medidas cautelares quando há um risco de
dano irreparável", explicou. "Olhando para o pedido dos advogados de
defesa e para a situação presente, consideramos que, neste momento, não
existe esse risco", disse.
Um dos danos irreparáveis, segundo ele, seria a perda
de direitos civis ou políticos por conta de uma ação. "Não estávamos
convencidos de que isso era o caso", disse. "Não há risco pessoal claro
ainda", apontou, alertando que o "estado presente é ainda muito
incerto".
De acordo com Frouville, o Comitê enviou uma carta ao
governo brasileiro comunicando a decisão. Mas também alertando que o
estado não poderá tomar medidas que sejam incompatíveis com o trabalho
do Comitê e nem no caso de Lula.
"Vamos continuar atentos sobre o que ocorre nesse caso
e, claro, os advogados de defesa tem o direito de voltar ao Comitê para
pedir medidas cautelares caso tenham novas informações", indicou. "Mas,
neste ponto, o Comitê não vê risco de dano irreparável", indicou.
Uma esperança entre aliados de Lula era de que a ONU
seguisse a mesma decisão que já havia tomado em um caso que consideravam
semelhante. Em março, ela atendeu a um pedido similar de políticos
catalães, presos nos últimos meses. A ONU recomendou, por exemplo, que o
deputado independentista Jordi Sanches, fosse liberado para que pudesse
participar de eleições. Mas o estado espanhol ignorou a recomendação da
ONU.
Eleição
Mesmo sem atender ao pedido dos advogados de Lula, a
ONU continua a avaliar o caso e juntar em um mesmo processo a questão da
admissibilidade e seu mérito. Mas alerta que dificilmente teria uma
posição final antes de 2019, depois, portanto, das eleições
presidenciais.
A queixa de Lula foi levada ao Comitê de Direitos
Humanos Nações Unidas em julho de 2016, pelo advogado Geoffrey
Robertson. A denúncia central era de que Moro estaria sendo parcial no
julgamento do ex-presidente. Em outubro daquele ano, as equipes legais
da ONU aceitaram dar início ao exame.
"Ainda não lidamos com o mérito do caso", explicou
Frouville. "Isso vai ser feito se o caso for aceito", disse. De acordo
com ele, o estado brasileiro recebeu seis meses de prazo para responder a
uma série de questões. "Nesse momento, não há ainda uma decisão sobre a
admissibilidade do caso", disse.
Depois disso, a defesa de Lula ainda tem mais quatro
meses para dar uma resposta aos comentários do Brasil. Se o obstáculo da
admissibilidade for superado, o Comitê então avaliará seu mérito
Na fase inicial de a avaliação de uma queixa, não se
avaliava o conteúdo do caso. Mas somente se a ONU tem o direito ou não
de examinar e fazer suas recomendações. Em 2017, o governo brasileiro
deu respostas às Nações Unidas sobre o caso, alegando que todas as
instituições do estado estão "funcionando" e que os direitos do
ex-presidente foram preservados.
Defesa
Para comentar a decisão da ONU, os advogados Cristiano
Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, que defendem Lula,
divulgaram a seguinte nota sobre o assunto.
"Recebemos hoje (22/05) do Comitê de Direitos Humanos
da ONU, com satisfação, decisão que confirma que o órgão internacional
está formalmente investigando as violações contra garantias fundamentais
do ex-Presidente Lula que apresentamos em comunicado individual
protocolado em julho de 2016. A admissibilidade do comunicado e o mérito
serão julgados conjuntamente. Trata-se do primeiro comunicado
individual feito por um brasileiro àquele órgão internacional",
escreveu.
"Na peça protocolada em julho de 2016, foram listadas
diversas violações ao Pacto de Direitos Políticos e Civis, adotado pela
ONU, praticadas pelo juiz e pelos procuradores da Operação Lava-Jato de
Curitiba contra Lula, seus familiares e advogados. Esse Pacto prevê,
dentre outras coisas: (a) proteção contra prisão ou detenção arbitrária
(Artigo 9º); (b) direito de ser presumido inocente até que se prove a
culpa na forma da lei (Artigo 14); (c) proteção contra interferências
arbitrárias ou ilegais na privacidade, família, lar ou correspondência e
contra ofensas ilegais à honra e à reputação (Artigo 17); e, ainda, (d)
do direito a um julgamento independente e imparcial (Artigo 14)"
"As evidências apresentadas no comunicado se reportam,
dentre outras coisas: (i) à privação da liberdade por cerca de 6 horas
imposta a Lula em 4 de março de 2016, por meio de uma condução
coercitiva sem previsão legal; (ii) ao vazamento de materiais sigilosos
para a imprensa e à divulgação de ligações interceptadas, inclusive
entre Lula e seus advogados; (iii) a diversas medidas cautelares
autorizadas injustificadamente; e, ainda, (iv) ao fato de o juiz Sergio
Moro haver assumido em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal, em
29/03/2016, o papel de acusador, imputando crimes a Lula por doze
vezes, além de antecipar juízo de valor sobre assuntos pendentes de
julgamento na 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba".
(Por
Estadão Conteúdo)
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