O ex-ministro José Dirceu e o ex-presidente Lula (Rodolfo Buhrer/Ueslei Marcelino/Reuters)
A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de conceder a liberdade ao ex-ministro José Dirceu (PT) tem, segundo especialistas, potencial para afetar todo o conceito de prisão em segunda instância no Brasil, em especial os casos da Operação Lava Jato, como o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Apesar de não ser uma decisão de plenário – colegiado que reúne os 11 ministros da Corte -, com efeito vinculante (que vale para outros casos), a liminar concedida pelos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski tem o peso de uma decisão colegiada que confrontou diretamente uma súmula do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Súmulas são uniformizações de decisões de tribunais. No caso do TRF4, existe uma que, especificamente, determina a prisão de condenados após esgotados os recursos em segundo grau.
“Por se tratar de uma decisão majoritária, acredito que os efeitos podem ser estendidos a todos que foram condenados em segunda instância e ainda esperam o julgamento de recursos no STJ e no STF”, opinou João Paulo Martinelli, professor de direito penal do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP-SP). “Para a maioria dos ministros, a prisão não pode ser automática, pois há necessidade de fundamentação. Se a decisão pela prisão não for fundamentada, o condenado deve aguardar os recursos perante os tribunais superiores em liberdade. Esse fundamento pode ser aplicado a todos os casos semelhantes, inclusive o de Lula”, prosseguiu.
No caso do ex-presidente Lula, a decisão da Segunda Turma indica que, se o julgamento de um recurso do petista não tivesse sido adiado – estava previsto para esta terça-feira, mas foi retirado da pauta -, muito provavelmente a maioria dos ministros teria definido pela soltura do ex-presidente. “A liberdade do réu condenado em segunda instância depende de sua sorte (ou azar) quando da distribuição do processo, já que a maioria da Segunda Turma tem entendimento diverso daquele firmado pelo plenário, quando do julgamento do habeas corpus de Lula”, analisou o advogado criminalista Luciano Fincatti.
O movimento do relator do recurso de Lula ao STF, ministro Edson Fachin, de enviar o pedido do petista ao plenário teve a intenção de evitar que a Segunda Turma – majoritariamente contra a prisão em segunda instância – desse a palavra final, mas dificilmente encerrará a novela judicial pela libertação do petista.
Constitucionalidade
Um dos caminhos possíveis é o da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) proposta pelo PCdoB, que questiona todo o instrumento da prisão após segunda instância. Relatada pelo ministro Marco Aurélio Mello, o processo aguarda para ser pautado no plenário do STF, o que a presidente da Corte, Cármen Lúcia, se recusa a fazer – ela é contra a rediscussão da prisão em segunda instância.As decisão no caso de José Dirceu, que deve se tornar o principal exemplo do “efeito loteria” na maior Corte brasileira – hoje, o réu obtém determinado resultado dependendo do colegiado no qual é julgado -, pode criar uma nova pressão para que Marco Aurélio volte à carga para pautar a questão antes do recesso do Judiciário, que vai de 2 a 31 de julho, ou para que, de forma ainda mais radical, o ministro decida pela concessão de uma liminar.
Por outro lado, os ministros favoráveis à execução provisória da pena devem dispor do argumento de que, além de ter sido julgado em Turma e não no plenário, o recurso de Dirceu diz respeito às especificidades dos argumentos do ex-ministro, o que não justificaria acelerar uma revisão do entendimento ou da reanálise do caso de Lula.
“A decisão não necessariamente sinaliza que ao ex-presidente Lula será concedido o mesmo benefício. Isso porque, em relação ao ex-ministro, a decisão se baseou na plausibilidade jurídica de seu recurso, algo absolutamente singular, e que diz respeito exclusivamente a ele”, argumenta o advogado Daniel Gerber.
(Veja.Abril.com.br)
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