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Moradores irregulares foram despejados de casas na manhã desta terça-feira (9) no Conjunto Praia-mar, na Zona Oeste de Natal — Foto: Igor Jácome/G1
Moradores do conjunto Praia-mar, na Zona Oeste de Natal, amanheceram
nesta terça-feira (9) com uma operação da Justiça e do Estado para
despejar pessoas que ocupam oito casas irregularmente na região há
vários anos. A ação de reintegração de posse aponta para um drama que
envolve tanto os verdadeiros donos quanto os invasores dos imóveis:
faltam moradias, principalmente para os mais pobres, no Rio Grande do
Norte. De acordo com a Companhia Estadual de Habitação, o déficit é de
60 mil imóveis.
As casas foram construídas pelo governo do estado dentro de um programa
de erradicação de favelas, mas foram invadidas antes de estarem
prontas. A cadeirante Juline Galdino da Silva, de 23 anos, afirma que
foi pega de surpresa. Morando há 2 anos no conjunto localizado no bairro
Cidade da Esperança, ela garante que o dono da casa deu o imóvel para
ela, ao tomar conhecimento de sua condição. O acordo, porém, não foi
formalizado por qualquer documento.
"A casa é minha. O dono não queria mais e me deu, doou a casa. Eu não
tinha para onde ir e ele viu a situação. Ele tinha condições, tem outra
casa. Eu ganho um salário mínimo, uso sonda, uso fralda, não tinha como
pagar aluguel. Deram 10 minutos pra gente sair. E eu vou pra onde? Não
tenho para onde ir", lamentou.
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Juline Galdino da Silva, de 23 anos, recebeu mandado de reintegração de
posse por casa onde morava há dois anos, no conjunto Praia-mar, na Zona
Oeste de Natal — Foto: Igor Jácome/G1
Entretanto, de acordo com a Cehab, o dono do imóvel sobre o qual Juline
fala era um ocupante irregular. Outra pessoa que já estava inscrita há
mais de 10 anos em no programa é a verdadeira beneficiária do imóvel.
Ainda de acordo com o órgão, os moradores já estavam notificados desde
outubro de 2018 de que precisavam deixar o local, o que é negado por
alguns deles.
"O Estado do Rio grande do Norte fez a reurbanização de 250 casas e
entregou o equipamento com calçamento, quadra, centro comunitário, lagoa
de captação. Dessas 250 casas, houve algumas invasões. De 2016 a 2019 a
Justiça vem determinando as reintegrações para que essas casas sejam
entregues aos beneficiários originários e por consequência o governo vem
cumprindo", diz o presidente do órgão, Pablo Thiago Lins.
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Pablo Thiago Lins, diretor da Cehab RN — Foto: Igor Jácome/G1
Ele ressaltou que os beneficiários originais são pessoas inscritas há
10 anos no programa, também em vulnerabilidade social. "São famílias com
a renda de meio salário mínimo per capita que estão há 10 anos
aguardando; estão morando de aluguel, ou de favor", lembra.
É o caso da faxineira Maria Aparecida Zacarias, de 30 anos. Ela lembra
que se inscreveu no programa em 2006 e até hoje espera receber o imóvel e
garante que vai dormir ainda nesta terça-feira (9) na sua própria casa.
"Estou esperando minha casa há 12 anos. Em 2006, levei os documentos
tudinho. De lá para cá, estou no aguardo. Estou morando no Planalto,
pagando no aluguel caro. Tenho que fazer faxina pra ajudar meu marido,
porque ele ganha um salário mínimo, não dá. Tudo que eu queria era só
poder pintar a parede da minha própria casa", diz.
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Maria Aparecida Zacarias, 30 anos, é uma entre os beneficiários
originais de casa no conjunto Praia-mar em Natal — Foto: Igor Jácome/G1
"Da mesma forma que o pessoal aqui luta para não sair, a gente luta pra
entrar, porque nós temos direito. Só Deus sabe a situação que a gente
passa", ressalta, sob lágrimas.
Durante a operação, o Estado não ofereceu outro local de moradia para
os despejados, mas disponibilizou transporte para onde eles desejassem
ir, além de um galpão para armazenar os imóveis temporariamente. De
acordo com o presidente da Cehab, eles poderão se inscrever em programas
de assistência social do município para também entrar em filas por
imóveis, mas ele declara que algumas das famílias não se encaixam na
faixa social que pode ser beneficiada.
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Oito famílias foram alvo de ação de reintegração de posse no conjunto Praia-mar, em Natal — Foto: Igor Jácome/G1
Mandado
O mandado de reintegração de posse foi assinado pelo juiz Bruno
Montenegro Ribeiro Dantas, da 4ª Vara da Fazenda Pública de Natal, no
dia 10 de janeiro, e determinou a devolução de 14 imóveis ao Estado do
Rio Grande do Norte e a construtora dos imóveis. De acordo com os
oficiais de justiça, a medida não aconteceu antes por causa da logística
necessária.
Estes eram os últimos imóveis ocupados na região. Ao longo dos anos,
foram mais de 60 casas ocupadas. Dos 14 notificados na última decisão,
seis já tinham deixado o local voluntariamente e receberam moradia no
condomínio Village de Prata - construído pela prefeitura. Porém oito
família, com média de quatro pessoas, cada, permaneceram no local. Os
proprietários originais foram até o local para receber os imóveis,
durante a manhã.
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Mandado de reintegração de casas ocupadas irregularmente no conjunto Praia-mar, na Zona Oeste de Natal — Foto: Igor Jácome/G1
A aposentada Maria Cordeiro e Oliveira, de 76 anos, diz que foi pega de
surpresa. Ela chegou à casa onde está com um filho, uma neta e uma
bisneta, há apenas oito dias, já após todas as notificações e avisos
judiciais. Diz que recebeu a casa da antiga proprietária. A situação,
entretanto, é a mesma de outros moradores. Apesar de não serem os
primeiros invasores, estão em casas que têm um dono à espera.
"A gente não sabia de nada. A maior injustiça que eu vi na minha vida é
essa. Eu não tenho condições nem de alugar uma casa. Agora eu tenho que
arranjar para onde eu tenho que ir, nem que seja pra baixo de uma ponte
ou de um pé de pau. Queriam botar meus troços na rua. Vou ter que
deixar a casa", diz.
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Maria Cordeiro de Oliveira, deficiente visual, recebeu ação de
reintegração de posse por casa no conjunto Praia-mar, em Natal: 'tenho
que sair' — Foto: Igor Jácome/G1
História antiga
Em 2008, o governo do estado lançou um projeto de erradicação de
favelas na avenida Capitão-mor Gouveia. Foram cadastradas famílias que
receberiam unidades habitacionais construídas pelo estado com recursos
do governo federal através do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC). A empresa Dois A Engenharia foi contratada para executar a obra.
Em setembro de 2010 houve uma ocupação ordenada de 137 casas, antes
mesmo do término da construção. Não havia água, eletricidade, nem
esgotamento sanitário. Mas, diante da ameaça de invasão, a Cehab
autorizou a ocupação dos moradores.
As obras continuaram e em novembro de 2011 houve a primeira invasão. A
Justiça autorizou a reintegração de posse e em janeiro de 2012 as
famílias saíram das casas. Em julho de 2012, 65 casas foram invadidas
novamente e, mais uma vez, a Justiça determinou a reintegração de posse,
que aconteceu em 2013. Desde então, o problema não se resolveu
plenamente e novas invasões aconteceram, tendo ocorridos novos processos
judiciais como esse.
Déficit
De acordo com a Cehab, existe um déficit atual de 60 mil moradias no
Rio Grande do Norte. O número é calculado com base em quatro variáveis,
que são:
- Domicílios precários (habitações alternativas, em condições precárias, improvisadas)
- Coabitação familiar, que diz respeito às famílias secundárias que dividem a moradia com a família principal e desejam construir novo domicílio
- Ônus excessivo com aluguel urbano - pessoas ou famílias que despendem 30% ou mais da renda de até três salários mínimos com aluguel
- Adensamento excessivo, que leva em consideração domicílios alugados com número médio superior a três moradores por dormitório
(Por Igor Jácome, G1 RN)
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