Nicolás Maduro em Assembleia Geral da ONU - Angela Weiss/AFP
Nações Unidas - As Nações Unidas aprovaram pela
primeira vez uma resolução contra o governo da Venezuela, pressionando o
país para que aceite ajuda humanitária e dando um mandado explícito
para que a entidade inspecione possíveis violações de direitos humanos
em Caracas.
A aprovação no Conselho de Direitos Humanos da ONU
mostra, na interpretação de diplomatas, que o regime de Nicolás Maduro
está cada vez mais isolado. O texto ainda reconhece, também pela
primeira vez, que o país vive "uma crise humanitária".
A votação também foi marcada pelo apelo de Brasil,
México e Europa contra qualquer iniciativa do governo de Donald Trump de
usar uma intervenção militar para dar um fim à crise.
A Casa Branca e mesmo a direção da Organização dos
Estados Americanos (OEA) têm falado abertamente sobre a possibilidade de
uma ação militar para derrubar Maduro.
Caracas denunciou na ONU nesta quinta-feira a aprovação
da resolução como "o início da escalada intervencionista" contra a
Venezuela.
O documento foi aprovado com 23 votos a favor, 7 contra
e 17 abstenções. Ficaram ao lado de Caracas apenas Cuba, Congo, China,
Paquistão, Burundi e Egito.
Para o Grupo de Lima, a aprovação do texto foi uma
"importante vitória diplomática", depois de anos tentando driblar a
blindagem que Maduro havia estabelecido em órgãos internacionais com a
ajuda de Rússia, China e seus aliados africanos. No resultado final,
velhos aliados de Maduro, como o Equador, votaram a favor da solução.
Nos bastidores, os chavistas pressionaram e enviaram
seu chanceler para se reunir com diversos países para tentar
convencê-los a não apoiar o documento. O temor do governo é de que a
crise seja declarada como um desastre humanitário e que a possível
comprovação de violações de direitos humanos deem justificativas para
uma intervenção militar.
A reportagem do jornal O Estado de S. Paulo foi a
primeira a revelar o conteúdo do documento, há duas semanas. No texto
aprovado nesta quinta, as instâncias internacionais monitorarão de forma
permanente a situação em Caracas.
Maduro não autoriza a entrada do escritório de Direitos
Humanos da ONU no país desde 2013. Mas a nova alta comissária da ONU
para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, espera negociar um acesso com
Caracas.
De acordo como texto, os governos pressionam a
Venezuela para que "aceite assistência humanitária para lidar com a
falta de alimentos e remédios, o aumento da desnutrição, em especial
entre crianças, e o surto de doenças que haviam sido previamente
erradicadas ou estavam sob controle na América do Sul".
O texto ainda "expressa profunda preocupação com as
sérias violações de direitos humanos", e qualifica a crise de
"humanitária". Entre os autores da proposta, poucos têm ilusões de que o
texto faça Maduro mudar seu posicionamento. Mas a aprovação mostra que o
líder chavista está cada vez mais isolado
Peru, em nome de onze países, garantiu que não existe
"desejo de interferir na Venezuela" e que existe um "respeito à
soberania" do país.
"Mas estamos preocupados com a crise que levou a um
êxodo de 2,3 milhões de pessoas. A meta é a de dar voz aos milhões que
sofrem e numa crise sem precedentes na região. Pedimos que o governo
venezuelano aceite a oferta generosa de ajuda", disse a delegação de
Lima representada pelo diplomata Claudio Julio de la Puente Ribeyro.
A delegação mexicana, falando também em nome do Brasil,
descreveu a situação como uma "crise humanitária", mas defendeu que
haja uma "negociação pacífica" para a situação e rejeitou qualquer ação
que possa envolver uma ameaça de intervenção ou ação militar.
Brasil
Em discurso, a embaixadora do Brasil na ONU, Maria
Nazareth Farani Azevedo, deixou claro que o País defende a resolução.
Ela disse que o governo nacional trabalha para a restauração da
democracia na Venezuela e quer que isso ocorra por meio de uma
"negociação pacifica". "Vamos continuar a promover iniciativas nesse
sentido e dentro da lei internacional", disse a embaixadora.
Mas ela também deixou claro que o Brasil não tolerará
apelos à intervenção militar na Venezuela. "Repudiamos qualquer pedido
de ação ou declaração que poderia implicar numa intervenção militar ou
exercício do uso da violência na Venezuela", declarou.
Ainda assim, a diplomata pediu que Maduro "coloque fim
às violações de direitos humanos, libere prisioneiros políticos e
respeite autonomia de poderes do Estado".
Em nome da Europa, que votou totalmente a favor do
texto, a Eslováquia afirmou estar "profundamente preocupada com o
fracasso de proteger os direitos, além do enfraquecimento de
instituições democráticas". Mas também deixou claro que a intervenção
não pode ser o caminho. "A Venezuela precisa de uma solução democrática e
de um processo de diálogo", defendeu.
Ataque
O embaixador da Venezuela, Jorge Valero, fez um duro
ataque contra os governos que votaram à favor da resolução. "Nunca uma
iniciativa foi tão hostil contra a Venezuela como essa", disse. "É uma
interferência em meu país e viola o diálogo. Trata-se de uma manipulação
política."
Para ele, o sofrimento da população é causado pelo embargo estrangeiro e por governos que querem "tutelar sobre a Venezuela".
Valero disse que é "falso chamar a crise de
humanitária". "Os países que promovem isso querem derrubar Maduro.
Denunciamos, portanto, essa resolução como o início de uma escalda
intervencionista", completou.
Saindo ao apoio de Maduro, o governo da China deixou
claro que "sempre defende a não intervenção". "Os venezuelanos tem
capacidade de lidar sozinhos com seus problemas e temos de apoiar uma
reconciliação", disse.
Cuba, que votou contra a resolução, denunciou o
documento por ser "uma interferência em assuntos domésticos da
Venezuela". "Estão usando os direitos humanos para politizar um ataque
contra o governo", denunciou.
Ao atacar a ideia de uma resolução, o chanceler
venezuelano, Jorge Arreaza, criticou o uso dos direitos humanos como uma
arma para justificar uma intervenção. Segundo ele, a assistência
humanitária é "cínica".
"Eles nos enforcam e depois querem nos salvar", disse,
acusando as sanções americanas e europeias como a razão pela crise que
sofre o país. "Estamos em uma guerra econômica", declarou.
Numa apresentação diante do Conselho de Direitos
Humanos, ele ainda insistiu que, apesar da crise, seu governo garante
educação, saúde e alimentos aos venezuelanos.
(por: Estadão Conteúdo)
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