É BRINCADEIRA VIU!!!
O aviso chegou por carta no fim de julho. “A partir do quinto dia
útil de agosto, moradores irão pagar de R$ 5 a R$ 10 mensais para ajudar
na segurança da comunidade”, dizia a correspondência, endereçada a
todos os moradores da Cidade Alta, em Cordovil, na Zona Norte do Rio. Ao
fim do texto, uma saudação acompanha a assinatura: “Atenciosamente, a
tropa do mano”.
O “mano” citado no bilhete, segundo um inquérito
da 38ª DP (Irajá), é Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, chefe do
tráfico da favela, que está foragido. Uma cópia da carta está anexada
numa investigação da distrital, que apura a criação de uma taxa de
segurança pelo tráfico da Cidade Alta.
Os valores a serem pagos, segundo
apuraram agentes da delegacia, dependem do poder aquisitivo de cada
morador: R$ 5 para os habitantes mais pobres, que vivem nos apartamentos
mais antigos, e R$ 10 para os que têm melhor condição financeira. O
valor é cobrado por domicílio.
O “IPTU da guerra” gera um lucro de
até R$ 20 mil por mês à quadrilha só com as taxas pagas pelos
moradores. A Cidade Alta tem pouco mais de 2.500 casas. Além dos
moradores, pagam pedágio para o tráfico mercados, bares, comerciantes e
responsáveis pela instalação de gatonet e internet nos apartamentos.
A
carta ainda dá uma recomendação a moradores insatisfeitos com a
cobrança: “caso haja alguma reclamação, por favor, procurar a associação
de moradores, pois as taxas estão acessíveis e não chega ao ponto de
qualquer reclamação”. Para a Polícia Civil, entretanto, a associação de
moradores também foi cooptada pelo tráfico. No último mês de junho,
agentes da 38ª DP prenderam os presidentes das associações da Cidade
Alta e da vizinha Parada de Lucas, Wagner do Carmo Lima e Jubdervan
Pereira de Menezes. Os dois são acusados de terem assumido os postos em
novembro do ano passado, quando a facção de Peixão, o Terceiro Comando
Puro (TCP), invadiu a favela e expulsou bandidos do Comando Vermelho
(CV). Na ocasião, o antigo presidente da associação da Cidade Alta, que
havia sido eleito pela população, teve que deixar a favela.
Após
a prisão de Wagner, no entanto, o tráfico o substituiu por outro
integrante da quadrilha: Sidnei Barbosa do Nascimento, que está
foragido.
— Ele assumiu a associação para ter controle sobre
população da Cidade Alta, para facilitar a permanência da nova facção —
afirma o delegado Delmir Gouvêa, titular da 38ª DP.
Pedágio para ônibus
A
Polícia Civil também investiga se ônibus foram proibidos de entrar na
Cidade Alta por se recusarem a pagar pedágio para o tráfico. Na
correspondência enviada aos moradores, a cobrança a uma empresa de
ônibus que controla uma linha que corta a favela é citada: “Em relação a
empresa de ônibus que negou-se a prestar ajuda, os mesmos não poderão
entrar na Cidade Alta até que entrem em acordo, caso contrário irão ser
convidados a se retirar da nossa comunidade”.
Segundo moradores da
favela, os ônibus deixaram, ao longo do mês de agosto, de parar dentro
da favela. As linhas passaram a margear a comunidade. No entanto, quando
foram intimados a prestar depoimento na 38ª DP, representantes da
empresa negaram a extorsão. Procurado, o Rio Ônibus alegou que “a
operação das linhas na região é regular, exceto em situações de
insegurança que impõem a adoção de itinerários alternativos, para
garantir a integridade de passageiros e rodoviários”.
Peixão
é conhecido na favela por ser controlador. Moradores afirmam que ele
instalou câmeras por toda a comunidade para monitorar a polícia e
moradores. O Disque-Denúncia (2253-1177) oferece R$ 2 mil por
informações que levem ao bandido.
Disputa pela favela
Para
tomar o controle dos pontos de venda de drogas na comunidade Cidade
Alta, Peixão utilizou drones no reconhecimento do território, que foi
invadido por seus comandados no fim do ano passado. Desde então, o TCP
domina a favela.
Em maio, bandidos do CV tentaram retomar a
comunidade. Para participar da invasão, foram recrutados criminosos de
diversas comunidades do Rio. Vários dos fuzis apreendidos pela polícia
tinham a inscrição “CX”, que investigadores dizem ser a identificação
das armas da “caixinha” da facção — distribuídas para traficantes de
várias favelas interessados em participar da ação.
No dia em que o
CV tentou retomar a favela, a Polícia Militar realizou uma operação na
Cidade Alta, na qual prendeu 45 pessoas — dois suspeitos foram mortos — e
apreendeu 48 armas, sendo 32 fuzis.
No ocasião, nove sargentos do
16º BPM (Olaria) são acusados de terem ajudado traficantes do TCP a
expulsarem o bando do CV. Uma investigação do Ministério Público e da
Corregedoria da PM revelou que os policiais levaram traficantes dentro
de um caveirão para dentro da favela.
Os sargentos Anderson
Nandler S. do Nascimento, Fábio Costa da Silva, Antônio Carlos da Cruz,
Ricardo Justino Lopes de Medeiros, Marcelo Augusto Cardoso Pereira,
Marcelo Theodoro Miranda, Gilmar Baptista dos Santos, André Luiz
Ferreira da Silva e Janderson Pereira Anacleto estão presos até hoje.
Numa
operação em junho, policiais localizaram a casa de Peixão em Parada de
Lucas. Não havia ninguém no local. O imóvel tem três andares, um deles
um amplo terraço, e é monitorada por câmeras. Numa das fotos feitas
pelos policiais, é possível ver um pequeno pula-pula na área externa da
residência.
(Extra.Globo.com)
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