MALUF NA CADEIA
FOI MALUF QUEM FEZ
O deputado do PP se entregou à Polícia Federal em
dezembro. Hoje está na Papuda, em Brasília (Foto: Givaldo
Barbosa/Agência O Globo )
O bilionário Joesley Batista
sentiu pena de Paulo Maluf quando o viu chegar à carceragem da Polícia
Federal em São Paulo, no dia 20 de dezembro. Escorado em três advogados e
uma bengala, o deputado federal do PP havia se entregado por volta das
9h da manhã. Ele obedecia a um mandado expedido pelo Supremo Tribunal
Federal por conta de uma condenação a sete anos e nove meses de prisão
por lavagem de dinheiro. Maluf estava duramente abatido. Veteranos de
cadeia, Joesley e seu irmão Wesley se voluntariaram para ajudar o novo
companheiro de cárcere. Fizeram a limpeza da cela do doutor Paulo e se
escalaram para passar a noite com ele, receosos de que o parlamentar de
86 anos passasse mal. Conversaram sobre amenidades e tentaram distraí-lo
o máximo possível.
A companhia e a presteza dos irmãos delatores,
que tornaram mais suave a chegada de Maluf ao xilindró, só duraram dois
dias. Em 22 de dezembro, o deputado foi transferido para o Complexo
Penitenciário da Papuda, em Brasília, no bloco 5 – a zona de elite
destinada a 60 presos vulneráveis, como políticos, empresários e
criminosos sexuais, apelidada de “camarote” pelos agentes
penitenciários. Na Papuda, apesar de ter sido bem recebido pelo
empresário Luiz Estevão, o rei do camarote, Maluf não conseguiu esconder
o desânimo. Alocado na ala B, o outrora altivo e falante político,
ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, se converteu num sujeito
taciturno na prisão. Estabeleceu uma boa relação com Estevão, outro
preso por corrupção, mas chora com frequência, principalmente quando
fala sobre a família, e se queixa das condições da prisão. Ainda não se
acostumou a comer a xepa – uma quentinha com arroz, feijão e um pedaço
de carne. Maluf reclama muito da comida, que considera sem graça. Já
perdeu ao menos oito quilos.
Enquanto tenta se acostumar à penúria da cadeia, Maluf deposita suas
esperanças na atuação dos advogados que tentam tirá-lo de lá. Uma das
frentes de ataque era um pedido de prisão domiciliar feito ao Tribunal
de Justiça do Distrito Federal, responsável pela execução da pena. Mas o
pedido foi negado na quinta, dia 22. A outra, no Supremo Tribunal
Federal, tenta anular totalmente a prisão. Isso porque a defesa
considera que o relator do caso no Supremo, ministro Edson Fachin,
não esperou que se esgotassem todos os recursos possíveis contra a
condenação. Na sentença que determinou a prisão imediata de Maluf,
Fachin argumenta que os recursos apresentados seriam “meramente
protelatórios”, ou seja, visariam somente adiar o início do cumprimento
da pena. Fachin ainda determinou que Maluf pagasse uma multa de R$ 1,3
milhão. Maluf foi condenado por desviar dinheiro da obra da Avenida Água
Espraiada, hoje chamada de Avenida Jornalista Roberto Marinho, na
década de 1990, quando ele era prefeito de São Paulo.
APOIO
Os irmãos Joesley e Wesley Batista se renderam ao mestre e até limparam sua cela (Foto: Andre Borges/Folhapress)
A defesa do deputado, feita pelo escritório Leite, Tosto e Barros
Advogados em parceria com a equipe do famoso criminalista Antônio Carlos
de Almeida Castro, o Kakay, entrou com um habeas corpus no
Supremo, cujo relator é o ministro Dias Toffoli. “Qual o risco que um
cidadão de mais de 80 (oitenta) anos, acometido de graves problemas de
saúde, com uma condenação apenas na vida, por delito sem violência, de
fato ocorrido há quase 20 anos atrás (sic), pode representar à
sociedade? Indiscutível que o paciente já não conta mais com as
condições físicas e emocionais para enfrentar as mazelas do sistema
prisional comum, sendo necessário um tratamento especial para garantir o
princípio da dignidade humana e as prerrogativas do Estatuto do Idoso.
Os prejuízos que virão a ser causados serão inegavelmente irreversíveis,
considerando a idade e fragilidade do requerente”, argumentou a defesa
no habeas corpus, assinado por Kakay e pelo criminalista Marcelo Turbay. Toffoli pediu informações ao ministro Fachin sobre o decreto de prisão. Não há prazo para sua decisão.
Paulo Maluf tem câncer de próstata. Está cego do olho direito. Tem
hérnia de disco. Sua cela foi adaptada a suas condições. O banheiro teve
barras de proteção instaladas, para que o deputado possa se apoiar
nelas, e a entrada foi alargada e teve um degrau suprimido, para evitar
quedas. O parlamentar ocupa a primeira cama de um treliche – a escada
serve para impedir que ele role e caia durante o sono. O detento Maluf é
um dos poucos que, em vez de calçar sandálias, usa tênis
antiderrapante.
Toda semana Maluf recebe atendimento médico e
injeções de analgésico na região dos quadris para atenuar as dores. Usa
fraldas geriátricas e às vezes solicita uma cadeira de rodas. O deputado
é auxiliado pelos companheiros de cárcere o tempo todo. Um detento
médico foi escalado para lhe servir de cuidador. Outros se revezam para
lavar suas roupas, atividade que ele não consegue executar por conta das
dores nas costas. Doutor Paulo retribui com uma caixinha aos colegas e,
quando o dinheiro acaba, pede um trocado emprestado a Luiz Estevão para
comprar um lanche na cantina do bloco 5 – geralmente uma pizza
brotinho, consumida pelos detentos mais abastados.
O deputado é
visitado apenas por um assessor, o historicamente fiel Jesse Ribeiro,
pois não permitiu que a família fosse até o presídio vê-lo. Maluf não
quer que sua mulher, dona Sylvia, de 81 anos, seja submetida à revista
íntima, que consiste em tirar a roupa e ser examinada por uma agente
penitenciária. Ainda que o agente não toque na visitante, o procedimento
é considerado humilhante por Maluf.
Na quinta-feira, 22, Maluf estava ansioso pela visita de seus
advogados. Perto das 18h, o advogado Kakay deu a má notícia. A terceira
turma criminal do tribunal entendeu que a Papuda oferece condições de
dar tratamento de saúde ao deputado e negou o pedido da defesa. “Pra ir
falar comigo, ele é acompanhado de um médico, porque não consegue andar
sozinho. Maluf está um pouco se definhando, cada vez mais fragilizado,
muito magro”, diz Kakay, um dos fundadores do Instituto de Garantias
Penais, criado por advogados criminalistas que defendem, entre outros, o
ex-deputado Eduardo Cunha, para “estarmos juntos nesta nossa luta pelas garantias constitucionais neste momento tão punitivo”.
Na
mesma noite, Kakay distribui uma nota a todos os seus contatos no
WhatsApp. O tom é de indignação pelo fato de doutor Paulo estar preso
“por um crime que teria cometido há 18 anos”. Maluf, diz o defensor, não
foi processado no mensalão ou na Lava Jato. Manter um idoso com doenças
gravíssimas preso “é uma desumanidade”, segue Kakay. “(Maluf) está pagando esta prisão pelo imaginário popular de uma imagem criada há 20 anos atrás (sic),
quando tinha 66 anos”, diz a nota. Cabe grifar que tanto o tal
“imaginário popular”, que associa Maluf à corrupção e à malversação de
dinheiro público, quanto a solidão na cadeia são, afinal, obras de
Maluf.
(AguirreTalento/Epoca)
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