domingo, 27 de julho de 2014

Estabilidade sem controle

SERVIDORES
Nadjara Martins - repórter

Servidores com mais de 70 anos recebendo salário. Remunerações acima do teto constitucional. Funcionários “desaparecidos” ou sem função determinada na folha. Pagamento de gratificações e adicionais indevidos. Licenças médicas que se renovam por anos. Carga horária de trabalho de 24 por 96 horas para serviço administrativo. Essas são apenas algumas situações encontradas na fatia da máquina pública que mais onera Prefeitura de Natal e Governo do Estado: o quadro de funcionários.
Arquivo TN
Prefeitura do Natal ainda não teve a reforma administrativaPrefeitura do Natal ainda não teve a reforma administrativa

Hoje, 35.935 pessoas compõem a folha de pagamento da administração estadual no RN (direta e indireta). Segundo o Relatório de Gestão Fiscal 2014 do Governo do Estado, R$ 290,9 milhões – ou 48,26% do orçamento público – está destinado a manutenção do quadro. O Estado já está acima do limite estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, de até 46,55% dos gastos destinados ao pagamento de funcionários. Já no município, são R$ 60 milhões por mês destinados ao pagamento de 19.600 servidores municipais.

Mesmo com o grande o contingente de pessoal, os serviços públicos, como saúde e educação, são deficientes. Para se ter uma ideia, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) paga R$ 50 milhões por ano pela manutenção de convênios com cooperativas, para completar o quadro de funcionários, ainda carente em 4 mil servidores.

Para a professora Tânia Inagaki, coordenadora do curso de Gestão Pública da UnP, o problema do funcionalismo não é o tamanho, mas a falta de controle sobre ele.  “Tem-se a ideia de que o serviço público precisa abarcar toda e qualquer pessoa que não gosta de trabalhar. Que estabilidade é essa? As pessoas acham que nunca vão ser demitidas, independente do que façam”, comenta. “A atividade pública fica aquém porque não se sabe quem está trabalhando”, avalia.

Na busca por melhorar a eficiência do serviço público, os administradores tem feito levantamentos e encontrado situações fora do normal.

Auditoria

Resquícios de administrações passadas ainda estão presentes nas contas da Prefeitura. Balanço feito pela Falconi Consultores de Resultado, empresa contratada pelo executivo em julho de 2013, mostra que a Prefeitura gastava até R$ 2,6 milhões anualmente com pagamentos “questionáveis” aos servidores.

 Entram na lista repasses feitos a funcionários falecidos, pagamento de gratificações, acúmulo indevido de cargos, excesso de cargos comissionados e salários acima do teto constitucional. Os primeiros cortes já começaram a ser feitos pela administração, mas os pagamentos ainda somam R$ 2,3 milhões/ano.

Contratada por R$904.940,00, a consultoria mineira auditaria os 21 mil contracheques do município durante seis meses. À época, o prefeito Carlos Eduardo Alves justificou a necessidade da contratação com números: a folha de pessoal do Município havia dobrado entre 2008 e 2012, passando de R$ 25 milhões para R$ 52 milhões. A consultoria era dividida em três eixos: análise da folha de pagamento, redução de despesas e maximização de receita. A primeira delas foi entregue em março deste ano.

A maior parte das situações ainda vai ser investigadas pela Segelm, portanto o corte de pagamentos não pôde ser suspenso.De acordo com o quadro resumo do estudo, a Prefeitura pagava, anualmente, R$ 329 mil a servidores falecidos. De acordo com o secretário de logística ambiental da Segelm, Mateus Duarte, os pagamentos já foram suspensos. “Nesse caso, o sistema da Natalprev não era ligado ao sistema, mas isso já foi restaurado. A partir de agora, para qualquer óbito que o cartório identifique, o pagamento já é suspenso”, afirma. Além dos mortos, o Município também fazia repasses irregulares a servidores com mais de 70 anos, que não cumpriam a aposentadoria compulsória. Também foram identificados repasses irregulares de adicionais insalubridade, noturno, por tempo de serviço e auxílio de coleta. Em conjunto, os repasses custavam R$ 183 mil anuais à Prefeitura. 

Cargos comissionados acima do autorizado por lei também foram identificados e custavam, em média, R$ 634 mil ao ano para o município. Um exemplo foi o número de cargos criados na empresa Segurança Alimentar e Nutricional (Alimentar): de nove, previstos em lei, para 34. A Secretaria de Assuntos Interinstitucionais e Governança Solidária (Serig) possui, sozinha, 26 comissionados. O pagamento dos servidores só será suspenso após a implantação da reforma administrativa, ainda em trâmite na Câmara Municipal.

O relatório ainda identificou o pagamento a servidores com acúmulo de cargos, o que gerava uma despesa de R$ 312 mil ao ano. O exercício de dois cargos administrativos no serviço público é proibido por lei. “São 300 cargos que precisam ser investigados. Pode ser repetição de matrícula e não má fé dos servidores”, avalia Duarte, secretário adjunto.

Outros dois pagamentos são questionados: R$ 359 mil em gratificações individuais para  servidores da saúde e R$ 875.530 em salários acima do teto constitucional, que é de R$ 20 mil (salário do prefeito). Ambos vão ser investigados pela Comissão de Análise de Revisão de Processo Administrativo (Carpa) da Segelm antes de serem cortados. A análise pode durar de 30 a 120 dias.

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